O Sol da Caparica arranca com 30 mil pessoas
Festival abriu com atraso que não foi recuperado, mas o saldo é positivo
Cerca de 30 mil pessoas marcaram presença na Quinta-Feira, no arranque da 7.ª edição do festival O Sol da Caparica, que decorre até Segunda-Feira na Costa da Caparica
Juntamente com a brisa do mar enrolada nas roupas, o sol ilumina a cara de quem está na fila há uma hora para entrar no evento. É o caso de Mariana Franco, que já foi ao festival há dois anos – antes da pandemia – e que este ano volta pela “vibração” que o Sol da Caparica transmite. Mariana diz esperar “bastante boas” perspectivas para este ano, até porque as pessoas “estão com vontade de aproveitar o Verão”.
Era suposto as portas do recinto abrirem às 16h, mas um atraso de uma hora e dez minutos leva as pessoas que estão na fila, ansiosas por entrar, a assobiarem para a segurança. Assim que as portas se abrem os festivaleiros são intercetados por um comité de boas-vindas do grupo Porbatuka. A cada batida feita no bombo, as pessoas param para ver o espetáculo.
A associação Porbatuka foi fundada em 2017 em Almada por Tiago Araújo, que diz ser “um sonho de criança” criar um projeto musical dedicado a crianças e jovens como forma de integração social. O grupo vai há três anos ao festival, mas este ano é a primeira vez que apostam na animação de recinto. “Faz todo o sentido estar perto do público, é o que mais gostamos”, explica Tiago. O Sol da Caparica, diz, é um festival “com juventude, sol, animação, humildade […] um festival diferente e com muita música portuguesa”.
Já dentro do recinto, o público começa a ouvir e a sentir ao longo de três palcos – Super Bock, Free Now e Comédia – música, alegria e a oscilação da dança. É neste ambiente que Pedro Henrique encontra o evento que diz ser “incrível”. “O clima é bom”, diz, esperando que “o resto dos dias seja assim também”.
“Vivemos este festival com grande ansiedade porque é como se, depois de três anos de interregno, tivéssemos começado do zero. Ser o primeiro dia e termos 30 mil pessoas dentro do recinto dá-nos satisfação e alegria”, declarou à Lusa Zahir Assanali, produtor do Grupo Chiado, empresa que é, a par da Câmara Municipal de Almada, responsável pela organização do evento.
Sentimento idêntico foi partilhado pelos vários artistas que passaram no primeiro dia pelos palcos de O Sol da Caparica, entre eles Virgul, Jimmy P, Clã, Fernando Daniel, Calema e Wet Bed Gang, que aludiu à interrupção do festival.
“Sou da margem Sul, do Monte da Caparica. Quero sentir que estou em casa. É bom podermos finalmente estarmos todos de volta aqui depois de um período em que não o pudemos fazer”, disse o cantor.
A alegria e descontração vividas pelos festivaleiros foram evidentes, a começar pelo facto de já quase ninguém usar máscara e de não existir uma preocupação aparente com o distanciamento social.
Por residir na Costa da Caparica, Rita Alves, de 28 anos, não teve de viajar tanto para chegar ao recinto, com uma amiga, a irmã, e os respectivos namorados.
“Vimos todos os anos ao festival O Sol da Caparica. É o único festival de Verão que costumo frequentar, por isso, já tinha vontade de vir. Além de actuarem no festival artistas que nos interessam ver, a outra razão importante para cá vir sempre é o facto de estar perto de casa e poder vir a pé”, explicou.
Zahir Assanali, acredita que a lotação do festival vai aumentar nos próximos dias. “A lotação máxima do recinto é 35 mil espetadores. A média por dia é 30 mil. O último e penúltimo dias do festival, Domingo e Segunda-Feira, 14 e 15 de Agosto, temos já 90 por cento da lotação máxima. Acredito que nessas datas iremos esgotar”.
Atrasos, filas e blackout
No entanto, esta edição não começou da melhor forma. Mesmo antes de chegar ao recinto, as filas para entrar eram significativamente grandes, por culpa dos atrasos que se faziam sentir e acabaram por se alastrar ao resto do dia. Assim sendo, os festivaleiros entraram no recinto com cerca de um hora de atraso, mas mesmo assim, mantinham o espírito de alegria e animação.
Já dentro do recinto, existiam vários bancas e palcos para visitar, como imensa oferta para explorar. Apesar disso, a área do palco Super Bock começou a encher muito antes do primeiro artista entrar em palco. E foi aqui que tivemos a confirmação dos atrasos que se adivinhavam. Jimmy P teve as honras de abrir o palco principal, com quase duas horas de atraso. Não por culpa do artista, pois o atraso estava presente em todos os palcos.
Quem não quisesse esperar, podia sempre dar um pequeno passeio pelo recinto. Do que estamos habituados em outros festivais, o Sol da Caparica tem algo que mais nenhum tem, um skatepark no meio do recinto. Com algum público disperso em volta, os skaters mostravam acrobacias de encher o olho.
Miguel Ângelo viu parte do seu set a ser cortado antes do concerto. The Legendary Tigerman nem sequer chegou a actuar.
Assim, o primeiro dia do maior festival da Margem Sul ficou marcado pelas dificuldades técnicas, que afectaram os concertos de vários artistas que faziam parte do cartaz.
“Ontem foi um dia estranho… Percebia-se, desde manhãzinha cedo, no ensaio de som, que as questões técnicas e prácticas do palco Free Now n’O Sol da Caparica estavam muito aquém do que é necessário para um festival com esta dimensão”, escreveu o artista Miguel Ângelo, no Instagram.
E acrescentou: “Tentava-se que todos os artistas em cartaz conseguissem ajustar as coisas da melhor forma, face aos horários muito apertados”, realça.
Miguel Ângelo viu duas canções e meia do seu set serem canceladas ainda antes do começo do concerto. Além disso, o espetáculo devia ter começado às 21h20, mas o músico só subiu ao palco às 00h17.
“Tenho uma carreira a caminho dos 40 anos e há coisas que simplesmente já não podem acontecer no Portugal dos Festivais em 2022”, conclui.
Há mais artistas com queixas sobre a organização do evento. Paulo Furtado, conhecido por The Legendary Tigerman, teve mesmo de cancelar o espetáculo marcado para as 22h30.
“Por razões que nos são alheias e relacionadas com a organização do festival, lamentamos profundamente o cancelamento do concerto de hoje. Pelo facto pedimos profundas desculpas aos nossos fãs”, desabafou na sua conta de Instagram.
Parte do público também não ficou satisfeito com estas sucessivas falhas no festival O Sol da Caparica. “Comprei bilhete de propósito para te ver. Foi uma pena, mas a organização era muito desorganizada. Depois de atrasos, ainda se leva com problemas de som”; “Tristeza de festival”; e “A organização nem uma explicação deu”, são alguns dos comentários feitos no post publicado por Paulo Furtado.
O promotor do festival adianta que está em negociações com Miguel Ângelo e The Legendary Tigerman para marcar novos concertos.
“Tivemos um pico de eletricidade no palco Free Now e o quadro foi abaixo. Dez minutos depois já estava tudo bem, mas o Miguel Ângelo achou que não tinha condições para actuar, e nós respeitamos isso”, explica.
Apesar das críticas e dos problemas que têm acontecido, o promotor garante que ambos os os artistas vão dar novos concertos para compensar os fãs. “Estamos em negociação para que isso aconteça ainda nesta edição”, diz Zahir Assanali. E conclui: “O que nós prometemos é fazer sempre mais e melhor”
O atraso considerável que marcou o início dos concertos que, não tendo sido recuperado, só foi aumentando ao longo da noite. A desorientação das pessoas que procuravam determinado artista num palco, à hora anunciada, e depois não o encontravam, foi uma constante ao longo deste primeiro dia.
Em palco
A lógica dos concertos neste festival mantem-se. Cada artista tem cerca de uma hora para mostrar o que vale, sendo que os concertos acabam por concentrar os seus maiores êxitos
Fernando Rocha abriu o palco comédia, com uma visível transformação física (mais magro). O humorista, aproveitando a juventude dos presentes, trouxe algumas piadas relacionadas com o bullying e também a paisagem envolvente: praia.
Jimmy P chegou ao palco principal cerca de uma hora depois do estipulado, mas começou em força, com o público a cantar com ele “Não tás a ver”. Assim que entrou em palco, os festivaleiros que estavam a encher a área do palco principal, esqueceram por completo o atraso, e deixaram-se ir nas boas energias que Jimmy P transmitia. O músico conseguiu aquecer bem as pessoas que já se encontravam no recinto e juntou, pirotecnia e muitos confettis, à musica, dando um colorido especial ao concerto. Sempre de um lado para o outro do palco, o artista não mostrava sinais de cansaço, e o público vibrava com o que estava a ver e a ouvir. “Contigo”, “Young Forever” e “Entre as Estrelas” integraram a atuação.
Como seria de esperar, o artista deixou os êxitos para o final. Mas o destaque vai para os momentos de interação com o público. Num modo provocatório amigável, Jimmy P perguntou onde estavam as mulheres, e depois os homens. Cada grupo respondeu com um enorme grito. De seguida perguntou onde estava a margem sul, com quase todo o recinto a responder, um sinal nítido do peso da população local no festival. Além disso, saiu do palco e foi para o meio do público, quando pedia para abrirem moshpits, mas de uma forma mais simples e simpática. Ao mesmo tempo, ouvia-se, o já clássico do que é bom. Por fim, mesmo antes do término do concerto com a música “Ano Novo”, o artista convidou para subir ao palco a Joceline, uma surpresa que agradou o público. No final de contas, Jimmy P aqueceu o público no regresso do Sol da Caparica, com boas energias que são habituais nos seus concertos.
Os Puro Rock, a banda de Palmela, trouxe um número visível de apoiantes, que se destacavam pelas t-shirts, animaram a entrada do festival. A Domingo Guerreiro, o carismático vocalista juntam-se Beto, na guitarra, Pedro Correia, na viola-baixo e Marinho, na bateria. Cantam rock em português e ainda trouxeram uma versão de “Rua do Carmo” dos UHF.
Seguia-se a atuação de Virgul. Com um pôr-do-Sol agradável, e apesar dos atrasos, as pessoas estavam felizes. Virgul veio para animar e agitar ainda mais o palco principal com o seu conjunto de ágeis bailarinas. Se no concerto dos Da Weasel, Virgul era um dos mais activos em palco, no seu concerto no Sol da Caparica, foi ainda mais activo. Foi o segundo artista a subir ao palco, e o segundo artista a “jogar em casa”, sendo que cresceu no Monte da Caparica, a uma curta distância de onde actuava. Algo que dava ao seu concerto outro significado. Da mesma forma, o público parecia admirar mais quem tivesse crescido na margem sul do Rio Tejo. “Quero dançar até ao amanhecer”, disse o cantor logo no início de espetáculo, depois de cumprimentar o público. Virgul também apelou à força do sexo feminino. Assim sendo, dedicou a música “I need this girl”, à mulher mais importante da sua vida, a sua mãe, que estava presente no recinto. Dado que é uma das músicas mais conhecidas do artista, e com dedicatória incluída, o público não ficou indiferente. A animação seguiu em crescendo, com conhecidos temas como “Rainha”. Natural da Caparica, Virgul mostrou-se contente de actuar na sua terra e dedicou “All We Need Is Love” à família presente. “Sejam felizes, Sempre!” disse antes de sair.
Se o público já estava desorientado com o atraso das actuações, não terá ajudado a alteração de ordem de Syro com Ive Greice. Muitos achavam que o artista revelação da música pop em Portugal já não marcaria presença no festival, mas o concerto acabou mesmo por iniciar já perto das 21h30 (estava agendado para as 19h). Diogo Lopes, que escolheu o nome artístico de Syro tem já uma sólida base de fãs, que marcaram presença nas primeiras filas e se estenderam pelo relvado. O olhar intenso aumentava o desconcerto de quem assistia e o cantor mostrou ainda os seus dotes de músico ao puxar um tambor para a frente palco, entrando no ritmo da música. “Perto de Mim” , “Deixa Passar” e “Acordar” foram temas que não podiam ficar de fora deste alinhamento.
Clã fizeram chegar o público mais maduro à frente de palco. Manuela Azevedo alinhou-se literalmente com os seus músicos. Lado a a lado com Fernando Gonçalves, Hélder Gonçalves, Miguel Ferreira, Pedro Biscaia e Pedro Rito, os elementos deste grupo musical trouxeram diferentes ambientes ao inicio de noite. Todos cantaram em uníssono a versão de “Conta-me Histórias” dos Xutos & Pontapés, seguida de “Sopro do Coração”. Seguiu-se uma explosão de energia com “Corda Bamba”. “Muito obrigada Sol da Caparica. Até sempre!” despediram-se depois de um momento em que quase transportaram a maior zona do recinto para a tenda eletrónica.
Os intervalos de concertos eram sempre de grande movimentação de pessoas. Face ao elevado número de entradas no recinto, as habituais filas para a restauração ou wc tornaram-se ainda maiores e muitos aproveitavam esse intervalo para espreitar o palco dança, onde a animação era sempre garantida. Os Dancecoolture deram provas de grande coordenação e ritmo na sua apresentação, e os animadores do palco dança deixaram depois espaço a que a assistência dançasse também, num abanar de ancas colectivo.
A emoção tomou conta do público durante a actuação de Fernando Daniel. Com êxitos já bem consolidados nos ouvidos das pessoas, o cantor e compositor português – que se tornou conhecido ao participar no Factor X Portugal e ao vencer a 4.ª edição do talent show The Voice Portugal – conquistou o público desde o primeiro momento. “Cair”, “Nada Mais” e “Raro” marcaram o início da sua atuação.
Com concertos em simultâneo, a decisão fazia-se por estilos. E a opção dos adolescentes era clara: Julinho KSD no palco secundário. Com 24 anos, Júlio Lopes é já um nome de destaque no panorama nacional de rap. Trouxe a este concerto os temas do seu álbum de estreia, “Sabi na Sabura” e também muita vontade de agitar as massas. Julinho KSD canta maioritariamente em crioulo cabo-verdiano e português, e mistura ambas as línguas também com inglês. “Bandidas”, “Gansgta”, “Vivi Good”, “Hoji Nka Tá Rola” e “Kriolu” fizeram-se ouvir na Caparica, mas também um radical “Sentimento Safari” com direito a roda de moche a completar a festa.
A dupla musical de irmãos de São Tomé e Príncipe, com origem em Portugal, formada pelos dois irmãos António Mendes Ferreira e Fradique Mendes Ferreira tomou depois conta do palco principal. Calema trouxeram a ondulação especial da costa africana para a Caparica e o público navegou nos seus conhecidos temas.
Com um atraso já de três horas, Miguel Ângelo fazia o possível por animar um público cansado pelo adiantado da hora, numa noite de semana. Era quase uma da manhã, quando tocava “Sou como um rio”, no início do concerto e houve um blackout. Com o público a aguardar serenamente o regresso, a banda acabou por descer à grade, pedir muitas desculpas pela interrupção e assim se despediram, sem condições para continuar. Por concretizar ficou também o concerto de The Legendary Tigerman.
Neste primeiro dia do Sol da Caparica, os DJs Rich & Mendes, pisaram o palco secundário. A boa energia, a animação e as grandes músicas estiveram sempre garantidas!
Os reis da noite foram os Wet Bed Gang. A banda conhecida por levar o público à loucura, não desiludiu. O grupo português de rap da Vialonga, conta com Gson, Zara G, Kro e Zizzy no núcleo duro. O projecto começou em 2014 e, desde então, tem conquistado os portugueses. Com milhões de visualizações no Youtube, já ultrapassaram os 350 mil ouvintes mensais no Spotify. Em 2021 lançaram o álbum “Ngana Zambi” , que bateu o recorde do álbum português mais ouvido no Spotify no espaço de uma semana e tornou-se o quarto álbum mais ouvido pelos portugueses nesse ano. Já haviam provado a sua popularidade no Sol da Caparica, na edição anterior, quando praticamente deitaram abaixo o palco secundário e tiveram agora oportunidade de actuar para uma multidão ainda maior. Abriram com “Mesa 8”, “300”, “Irresponsável” e “Faço a minha”. Estão constantemente a interagir com o público e conseguem que cada concerto seja único e personalizado para “cada um dos irmãos” que assiste. Há quem tenha vindo atrás do tema mais conhecido “Devia Ir”, que fechou a noite, mas ninguém ficou indiferente à explosão de energia e a boa vibe que os Wet Bed Gang trouxeram para o palco.
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