Cantar as Janeiras em Almada

A tradição das Janeiras volta a cumprir-se em Almada, desta vez a 4 de Janeiro. Das 10h às 13h acontecem na Praça Lopes Graça, no Laranjeiro, e a partir das 19h no Solar doz Zagallos, na Sobreda. Em ambos os eventos a entrada é livre.

A Praça Lopes Graça, acolhe 12 grupos de danças e cantares, tunas académicas, grupos corais, ranchos folclóricos, e grupos de cante alentejano, todos do concelho. Estas serão umas Janeiras transversais culturalmente, com canto, música e dança. Confira o cartaz abaixo para ficar a par de todos os participantes.

A organização é da Junta de Freguesia do Laranjeiro e Feijó (JFLF).

A partir das 19h, é no Solar dos Zagallos que as Janeiras acontecem. São 25 os grupos corais, tunas, associações e coros do concelho, vão interpretar temas tradicionais alusivos à época natalícia. Se cantar não for a sua especialidade, deixe isso com os profissionais, e desfrute de chocolate quente e bolo-rei. Pode consultar o programa aqui.

A organização é da Câmara Municipal de Almada (CMA), e está ainda inserida na Programação de Natal do Feliz Almada 2024.

Um pouco de história

No concelho de Almada, Cantar as Janeiras era até ao Estado Novo, uma das principais tradições nas comunidades rurais e marítimas, da Caparica, Vila Nova da Caparica, Sobreda, Charneca da Caparica, Trafaria, Porto Brandão e Costa da Caparica. Na vila de Almada, Piedade, Mutela, Romeira, a tradição não era tão acentuada devido à forte industrialização, com destaque para a indústria corticeira, ao movimento operário e aos ideais do anticlericalismo, republicanismo, e anarquismo. As festividades faziam-se de forma espontânea, por jovens e adultos de sexo masculino e feminino que saíam pelas ruas e azinhagas. Não existiam então grupos corais.

Nos meios rurais e sobretudo nos núcleos marítimos, onde a religiosidade era mais forte, nalguns anos realizava-se o “Cantar ao Menino”, só cantado nas igrejas e capelas locais. Ao contrário, o “Cantar as Janeiras e os Reis” era sempre feito na comunidade, fora das igrejas, tendo em conta as características de algumas quadras cantadas, as chamadas “chacotas”, alusivas aos votos de felicidade, de sorte e de saúde para os donos das quintas e casas mais abastadas. Na imprensa almadense, no final do século XIX e princípios do século XX, encontram-se alusões a situações de miséria, sobre pessoas que integravam os grupos de cantadores de Janeiras, para receberem comida, para matar a fome.

O cantar das Janeiras visava obter dos proprietários ou residentes nas casas dispersas na região algumas ofertas, desde o pão ao chouriço, nozes, figos, doces e sobras da festa do Natal. Nos meios rurais da Caparica, Murfacém, Vila Nova, Lazarim, Sobreda e Charneca da Caparica chegava-se a receber, ainda no século XIX, “uma pinga de vinho”, e por vezes meio copo de aguardente para proteger os cantadores do frio e da humidade nocturna. Uma vez ou outra, dava-se dinheiro, embora não fosse essa a tradição.

Cantavam-se quadras alusivas os usos e costumes trazidos pelos habitantes que emigraram de vários pontos do país à procura de trabalho,principalmente vindos do Alentejo, do Algarve, da Beira Baixa, de Lisboa e seus arredores, para os concelhos de Almada e Seixal

No fim das caminhadas, pelos meios urbanos, rurais e marítimos da Margem Sul, as ofertas recebidas iam para o saco comum de cada grupo que depois eram repartidas, em espírito comunitário, pelos cantadores.

A origem das Janeiras são vagas, no entanto, cantar as Janeiras é sinónimo de cantar os Reis. Sabe-se ainda que a tradição das Janeiras deriva de costumes pagãos. Os romanos comemoravam a entrada no novo ano em nome de Janus, o porteiro celestial, deus do passado e do futuro, que fechava a porta do ano que findava e abria a porta do que se iniciava. Janus terá dado origem à denominação do primeiro mês do ano, Janeiro, que se inicia depois do solstício de inverno. Por conseguinte, a tradição de Cantar as Janeiras está associada a este costume dos romanos.

O cantar os Reis é, por sua vez, uma tradição cristã que corresponde à quadra festiva de Natal. Os Reis, segundo a Bíblia, correspondem aos três reis magos, Baltazar, Belchior e Gaspar que foram dar as boas vindas a Jesus, nascido pouco depois do solstício de Inverno, ofertando-o com incenso, ouro e mirra. Esta é uma tradição que pretende tornar presente a adoração ao menino Jesus.

A tradição popular, ao longo do tempo, fez uma simbiose, fundindo-as numa só. É uma tradição que se realiza desde o primeiro dia de Janeiro, estendendo-se até dia 6, Dia de Reis ou Epifania. Consiste num grupo de pessoas que vão pelas ruas cantar de porta em porta, anunciando o nascimento de Jesus e levando com eles votos de um Bom Ano Novo a quem a porta abrir.

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