Almada | O Cinema Brasileiro está de volta

De 25 a 29 de Julho, o Auditório Fernando Lopes-Graça acolhe a 17ª Mostra do Cinema Brasileiro, com entrada livre

O Auditório Fernando Lopes-Graça apresenta, de 25 a 29 de julho, a 17ª Mostra do Cinema Brasileiro, onde poderá assistir ao que de melhor se faz na sétima arte brasileira, nas áreas do documentário e drama. O evento conta com o apoio da Embaixada do Brasil. A entrada é livre, com levantamento de bilhete obrigatório.

25 de Julho, 21h | Nheengatu: A Língua da Amazónia 

Ao longo de uma viagem no alto Rio Negro, um afluente do rio Amazonas, na Amazónia profunda, o realizador procura uma língua imposta aos índios pelos antigos colonizadores. Através desta língua misturada, o Nheengatu e, dividindo a filmagem com a população local, o filme constrói-se no encontro de dois mundos. A língua Nheengatu, ou antiga Língua Geral Amazónica, é uma mistura do tupi, do português e de várias outras línguas indígenas. Uma das línguas mais faladas na região Norte do Brasil até meados do Séc. XIX, foi utilizada pelos portugueses, jesuítas e brasileiros como forma de aproximação e catequização dos índios, até Portugal perceber que para reconhecer o Brasil como seu e definir as suas fronteiras, teria de fazê-lo também através da língua portuguesa, banindo assim o Nheengatu.

No entanto, o Nheengatu sobreviveu no norte da Amazónia, na região do Alto e do Médio Rio Negro. Ao longo do tempo continuou a ser usada na catequese e, ao mesmo tempo, tornou-se a língua materna de muitas populações indígenas que perderam a língua materna com a colonização. Actualmente, é falada por parte da população das regiões de São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro, no noroeste da Amazónia, na fronteira com o Brasil, Venezuela e Colômbia. São Gabriel da Cachoeira, município onde 75% da população se declara indígena, é o único no Brasil que tem três línguas indígenas, o Nhebengatu, o Tukano e o Baniwa, reconhecidas como oficiais, em conjunto com o Português. O Nheengatu está em riscos de extinção, tendo apenas cerca de 6000 falantes, segundo o Atlas de Línguas em Perigo da Unesco.

O documentário não pretende fazer uma abordagem da língua de forma científica, mas sim um registo da sua história oral popular ainda remanescente e da sua contemporaneidade, através das histórias das populações indígenas. Para dar voz ao património oral dessas populações, o realizador foca-se nas histórias que foram passando de geração em geração, contadas nesse idioma, e na herança que representam. O filme é mais um exercício antropológico e um registro histórico da situação da língua que dá título ao documentário, conhecida também como Tupi Moderno, do que cinema.

O filme foi apresentado em estreia mundial no DocLisboa 2020.

©DR / O Nheengatu, ou antiga Língua Geral Amazónica, é uma mistura do Tupi com o Português e outras línguas indígenas.

Ficha Técnica:

Título original: Nheengatu: A Língua da Amazónia
Realização: José Barahona
Argumento: José Barahona
Produção: Fernando Vendrell, Carolina Dias, Robson Medina
Elenco: Locais
Fotografia:  Mário Franca
Música: Clower Curtis
Som:  Guilherme Algarve
Edição: Jordana Berg
Género: Documentário
Origem: Brasil, Portugal
Ano: 2020
Duração: 115 minutos
Classificação: M/12

26 de Julho, 21h | Que Horas Ela Volta? 

Val (Regina Casé), uma mulher de Pernambuco, vai para São Paulo em busca de uma vida melhor. Para se sustentar e poder enviar dinheiro, deixa Jéssica (Camila Márdila), a filha ainda pequena com os avós. Em São Paulo, encontra emprego primeiro como babysitter e, depois, como empregada doméstica interna na casa de Bárbara (Karine Teles) e José Carlos (Lourenço Mutarelli). Esta é uma família de classe alta, onde ela trata do filho dos patrões Fabinho (Michel Joelsas), como se este fosse seu. Val é o tipo de empregada interna que leva o trabalho muito a sério, pois abriu mão de seus sonhos e interesses pessoais, em detrimento de cuidar da casa e da vida dos patrões, para conseguir proporcionar uma vida melhor à filha. Enquanto serve canapés perfeitos de manhã à noite, cuida também com amor do filho adolescente dos patrões, que criou desde bebé. Treze anos depois, é economicamente estável mas sente-se culpada por ter deixado para trás a filha Jéssica. 

Tudo e todos estão no lugar certo nesta casa elegante, até ao dia em que Jessica, a filha ambiciosa e inteligente de Val, regressa para fazer os exames de admissão à universidade de Arquitectura. Os patrões de Val, contentes com a notícia, insistem para que a rapariga fique em sua casa. O reencontro na capital paulista rompe a separação forçada há muitos anos. Porém, a chegada de Jéssica põe em risco o equilíbrio que até aí existiu, entre a submissão cega da empregada e o poder mudo do dinheiro existente naquela casa. Todos serão atingidos pela autenticidade da sua personalidade. No meio deles, dividida entre a sala e a cozinha, Val terá que encontrar uma nova forma de estar na vida.

Dentro deste amplo lar de classe média-alta, Val é considerada “quase da família”, tendo criado os filhos dos patrões como se fossem os seus, mas faz as suas ,refeições numa mesa separada, dorme no quarto dos fundos e, nunca colocou os pés na grande piscina onde os outros se divertem. A empregada doméstica foi o símbolo escolhido para ilustrar a condescendência de uma certa elite brasileira, que acredita ter sido criada para ocupar tal posição. Este é um drama sobre desigualdade de classes superiores e inferiores, ricas e o pobres, entre senhores e escravizados, patrões e empregados; ainda existente no Brasil. Ao mesmo tempo é um filme sensível e delicado com alcance social. Uma comédia trágica e carismática sobre uma empregada doméstica, num rico bairro de São Paulo.

A estreia mundial do filme aconteceu no Sundance Film Festival de 2015. Em Setembro do mesmo ano, foi a escolha do Ministério da Cultura brasileiro para representar o Brasil, na edição de 2016 dos Oscares, na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, não tendo vencido o prémio.

©DR / Val criou o filho dos patrões como se fosse seu.

Ficha Técnica:

Título original: Que Horas Ela Volta? 
Realização: Anna Muylaert
Argumento: Anna Muylaert
Produção: Fabiano Gullane, Caio Gullane, Débora Ivanov, Anna Muylaert
Elenco: Regina Casé, Michel Joelsas, Camila Márdila, Karine Teles, Lourenço Mutarelli, Helena Albergaria
Fotografia: Bárbara Alvarez
Música: Vítor Araújo, Fábio Trummer
Edição: Karen Harley
Género: Drama
Origem: Brasil
Ano: 2015
Duração: 114 minutos
Classificação: M/12

27 de Julho, 21h | O Clube dos Anjos 

Durante mais de três décadas, sete amigos reuniram-se mensalmente à volta da mesa para partilhar uma refeição. Chamaram-lhe o Clube do Picadinho. Os encontros são palco de grandes banquetes, que celebram a vida, a amizade e o prazer da fartura de comida.

Se, de início, o mote era o simples prazer da comida e a companhia uns dos outros, com o tempo foi-se tornando num ritual mais complexo, com debates de ideias, partilhas de sonhos e confissões de fracassos. O fim, seria o único destino digno, do que se tornou um verdadeiro muro de lamentações. O Clube do Picadinho torna-se num grupo de pessoas com comportamentos quase patéticos, tristes e, apoiados nos últimos fios de esperança, diante da decadência. Toda a imponência celebrada no início, muito representada pelo exagero dos jantares, torna-se sinónimo de fracasso ao longo do tempo.

Com o passar dos anos, a fartura, na verdade, aponta para o ridículo da situação: aqueles homens continuam apegados a um passado que já não faz sentido, que já não significa sucesso e que não os preenche, física ou intelectualmente. A passagem do tempo acentua costumes que tornam a convivência inviável e vão revelando quem realmente são essas pessoas: caricaturas do que já foram um dia e estereótipos comuns na vida real, da falsa intelectualidade, hipocrisia moral e fragilidade emocional. A fome é o único desejo recorrente.

Cada vez mais frustrados com as próprias vidas, o clube desmorona em desentendimentos entre os seus integrantes, até que o surgimento de um novo cozinheiro muda tudo. Os anos passaram, as vidas correm-lhes agora bem e, têm posses suficientes para serem servidos por Lucídio, um chef talentoso, misterioso e sinistro, que lhes proporciona um banquete inesquecível. Os laços de amizade estão de volta, é a gula como celebração da vida. Contudo, na manhã seguinte, um deles aparece morto. Isso não impede a continuação dos reencontros, nem as consecutivas mortes dos comensais.

O Clube dos Anjos reflecte sobre uma masculinidade ultrapassada, o apego perigoso a memórias de um passado que desembocou num presente triste, mas que de alguma forma, continua a ser um lugar confortável. É melhor morrer agarrado a convicções ultrapassadas do que fazer um esforço para mudar? Cada personagem da história de Veríssimo e de Defanti responde a esta pergunta de forma particular e, com diferentes justificações.

O livro “Gula – O Clube dos Anjos”, de Luís Fernando Veríssimo, foi publicado em 1998, como parte de uma colecção que se inspira nos sete pecados mortais. O escritor, como o título indica, escreveu uma história contemporânea sobre a gula.

©DR / O Clube dos Anjos reflecte sobre o apego perigoso a memórias de um passado que desembocou num presente triste

Ficha Técnica:

Título original: O Clube dos Anjos
Realização: Angelo Defanti
Argumento: Baseado na obra de Luís Fernando Veríssimo, Angelo Defanti
Produção: Sara SilveiraI, Bárbara Defanti, Angelo Defanti
Elenco: Matheus Nachtergaele, Marco Ricca, António Capelo, Augusto Madeira, André Abujamra, Paulo Miklos, Ângelo Antônio, Samuel de Assis, Otávio Müller, César Mello, Arthur Asson
Fotografia: Rui Poças
Música: André Abujamra
Edição: Livia Arbex
Género: Drama, Thriller
Origem: Brasil, Portugal
Ano: 2019
Duração: 101 minutos
Classificação: M/14

28 de Julho, 21h | Miúcha, A Voz da Bossa Nova 

Miúcha, é uma voz feminina que se liberta neste documentário das descriçoes que a reduziram a irmã de Chico Buarque, aluna de Vinicius de Moraes, segunda esposa de João Gilberto, parceira musical de Antônio Carlos Jobim e de Vinicius de Morais e, a acompanhante vocal do saxofone de Stan Getz. As suas contribuições para o movimento da bossa nova, a forma como navegou o seu casamento e tentou definir a sua carreira, são aprofundadas. O filme conta com arquivos pessoais que incluem fotografias, cartas, aguarelas e gravações áudio. 

A vida de Miúcha é inevitavelmente descrita pelo prisma dos homens que a rodearam e cuja fama obscureceu a sua voz. As gravações caseiras, os depoimentos e os arquivos pessoais, revelam uma mulher com um apetite gigante pela música e pela vida cosmopolita. Este é um retrato de uma mulher que teve dificuldade em soltar-se das amarras de um modo de existir normativo e, que ganhou uma carreira a solo a muito custo.

Nascida no Rio de Janeiro em 1937, Miúcha é filha do historiador Sérgio Buarque de Holanda e da pintora e pianista Maria Amélia Césario Alvim. Irmã de Chico Buarque, foi casada com João Gilberto, o “pai” da Bossa Nova, com quem teve uma filha, Bebel Gilberto, que também é cantora. Pupila de Vinícius de Moraes, Miúcha foi também companheira de Tom Jobim, foi acompanhada pelo famoso saxofonista Stan Getz e cantou ao lado de Pablo Milanés. Conviveu com os chamados “grandes homens”, mas o seu talento vive para além das suas sombras, ainda existentes.

Entre Nova York, Paris, Cidade do México e Rio de Janeiro, o documentário de Liliane Mutti e Daniel Zarvos costura imagens e, revela os percalços de ser uma mulher latino-americana no mundo da indústria musical internacional.

Durante os anos 1960 e 1970, Miúcha, a anti-musa da Bossa Nova, enfrentou as dores e reviravoltas do sonho de se tornar cantora. A primeira vez que gravou em estúdio foi em 1975, num disco em parceria com João Gilberto e Stan Getz. Aos 40 anos, em 1977, lançou o primeiro de treze discos, ao lado de Tom Jobim, com quem viria a fazer inúmeras parcerias. Os músicos homens da vida de Miúcha ofuscaram-na.

Mas o espírito vibrante de Miúcha não podia ser contido, mesmo enquanto ela lutava para encontrar sua própria voz, neste mundo dos homens que a rodeava. Conquistou um sucesso sem precedentes, tornando-se um símbolo da resistência feminina e uma lenda musical, para sempre.

©DR / Miúcha foi eclipsada pelos homens famosos da sua vida, mas conseguiu vingar na música

Ficha Técnica:

Título original: Miúcha, A Voz da Bossa Nova 
Realização: Liliane Mutti e Daniel Zarvos
Argumento: Liliane Mutti
Produção: Mostafiz Shahmohammed, Marta Sanchez, Daniel Zarvos
Elenco: Miúcha, Silvia Buarque, João Gilberto, Tom Jobim, Vinicius De Moraes, Chico Buarque
Fotografia: Luiz Bonfá, Chico Buarque, Pierre-Paul Puljiz, Jonas Mekas
Música: Ruben Jacobina
Edição: Daniela Ramalho, Isabel Castro
Género: Documentário
Origem: Brasil, França, Estados Unidos
Ano: 2022
Duração: 98 minutos
Classificação: M/12

29 de Julho, 17h | O Lobo Atrás da Porta 

Clarinha desaparece da creche, levada por uma mulher que se diz amiga da mãe. É dada como desaparecida numa esquadra de polícia pelos pais, Bernardo e Sylvia. No decurso da investigação, os dois são ouvidos separadamente. O delegado apercebe-se que Bernardo tinha uma relação extraconjugal com Rosa. Sylvia não sabia de nada até ao momento. A amante é chamada a depor para averiguações. É dito que o rapto da criança não é nada sério, apenas uma brincadeira de Rosa, uma amante ciumenta que tenta chamar a atenção do homem que ama. No entanto, as pequenas vinganças passionais vão ganhando contornos mais sombrios. Quando o delegado junta as informações, compreende que tudo se contradiz, que entre os três esconde-se uma história de amor doentia, onde o desejo, a traição e os ciúmes levam a uma tragédia inevitável.

O argumento avança de acordo com os depoimentos, à medida que os personagens fornecem as suas versões e álibis, flashbacks ilustram cada ponto de vista. A forma de representar a agressão no ecrã coloca o conteúdo chocante fora da imagem, sugerido pelo som, pelo que está fora do enquadramento, aqui utilizado de forma claustrofóbica focando-se nos rostos, na pele, na nuca das personagenss, em planos fechados. Fernando Coimbra, estreou-se na realização com este filme, onde demonstrou imediatamente ser um dos realizadores mais promissores do cinema brasileiro

O que começa como um caso policial transforma-se, pouco a pouco, num inquérito à vida pessoal de um trio de protagonistas, revelando segredos, mentiras e, sobretudo, a violência e a miséria emocionais, escondidas em fachadas domésticas. O filme é um olhar sobre a classe média brasileira, inspirado num caso real que ficou conhecido no Brasil como “a fera da Penha”, amplamente noticiado pela imprensa nos anos 60 e com grande impacto na sociedade brasileira. 

©DR / O Lobo atrás da porta é inspirado num caso real que ficou conhecido no Brasil como “a fera da Penha”

Ficha Técnica:

Título original: O Lobo Atrás da Porta 
Realização: Fernando Coimbra
Argumento: Fernando Coimbra
Produção: Karen Akerman, Caio Gullane, Fabiano Gullane
Elenco: Milhem Cortaz, Fabiula Nascimento, Leandra Leal, Juliano Cazarré
Fotografia: Lula Carvalho
Música: Ricardo Cutz
Edição: Karen Akerman
Género: Drama, Thriller
Origem: Brasil
Ano: 2013
Duração: 101 minutos
Classificação: M/16

29 de Julho, 21h | Aos Nossos Filhos

Vera, uma mãe dedicada, divorciada de três casamentos, vive numa família grande com os seus filhos e enteados. É uma mulher que lutou com armas contra a ditadura, carrega terríveis traumas do passado, morou em diversas partes do mundo e, coordena uma ONG de apoio a crianças órfãs seropositivas. Apesar do seu altruísmo e da sua história de vida em defesa da liberdade, sente muita dificuldade em lidar com a decisão da filha, de ter um filho por inseminação artificial. Tânia, a sua filha, vive uma relação há 15 anos com Vanessa que se encontra grávida do primeiro filho. A notícia gera um embate intenso na relação entre mãe e filha, que discordam completamente uma da outra.

O filme é uma adaptação ao grande ecrã da peça escrita por Laura Castro, que fala sobre a ditadura militar brasileira, iniciada a 1 de Abril de 1964 e que durou até 15 de Março de 1985, ao mesmo tempo que reflecte sobre vários aspectos da maternidade e do conflito de gerações. Através da história de uma família, em particular da história de uma mãe e filha, que apesar de serem ambas progressistas têm uma certa dificuldade, ou apenas prioridades diferentes, na aceitação das principais motivações de cada uma.

©DR / Vera coordena uma ONG de apoio a crianças órfãs seropositivas.

Ficha Técnica:

Título original: Aos Nossos Filhos
Realização: Maria de Medeiros
Argumento: Laura Castro, Maria de Medeiros
Produção: Laura Castro, Marta Nóbrega, Paula Cosenza, Thierry Lenouvel, Denise Gomes
Elenco: Marieta Severo, José de Abreu, Laura Castro, Cláudio Lins, Marta Nóbrega, Ricardo Pereira, Andrei Cardoso, Denise Crispim
Fotografia: Edgar Moura
Música: Jefferson Feliciano, Cristina Bhering, Laura Castro
Edição: Maria de Medeiros, Manuel de Sousa
Género: Drama
Origem: Brasil, França
Ano: 2019
Duração: 107 minutos
Classificação: M/14

Contacto da Bilheteira do AFLG
Tel.: 212 724 922 | auditorio@cm-almada.pt
Quarta a Sábado das 10h – 13h | 14h30 – 18h
1 hora antes de espectáculo ou sessão de cinema

Sofia Quintas

Directora e jornalista do Almada Online

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