Associação Zero considera “inaceitáveis” novas travessias rodoviárias no Tejo

Projectos entre Algés-Trafaria e Barreiro-Chelas não são solução, defende a associação

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A construção de novas travessias sobre o rio Tejo voltou a estar no centro do debate público, depois do Jornal Económico ter avançado que o Governo pretende construir um túnel imerso entre Algés e a Trafaria. O projecto, que integrará um pacote rodoviário mais alargado, inclui ainda a terceira travessia sobre o Tejo, que ligará Chelas ao Barreiro. Em reacção à notícia, a associação ambientalista Zero manifestou-se contra a inclusão de acessos rodoviários nas novas infraestruturas, considerando a medida “inaceitável” face às actuais metas climáticas do país.

Embora o Governo ainda não tenha apresentado formalmente o projecto, a Zero refere que, de acordo com as informações disponíveis, tanto o túnel imerso como a terceira travessia do Tejo incluirão vias para veículos individuais, algo que a associação considera contrário à necessidade de reduzir o tráfego automóvel e as emissões poluentes.

“A principal prioridade em mobilidade urbana deve ser a redução significativa do uso de transporte individual, a diminuição dos tempos de viagem no transporte público e compartilhado, além da electrificação dos veículos de grande circulação”, defende a Zero em comunicado. A associação critica ainda a decisão de avançar com obras que potenciam o uso do carro em detrimento do investimento em transportes públicos.

Os presidentes das câmaras municipais de Oeiras e Almada, Isaltino Morais e Inês de Medeiros, manifestaram-se favoráveis à construção do túnel entre Algés e a Trafaria, projecto que tem vindo a ser discutido há vários anos. Em declarações à Antena 1, Isaltino Morais considerou que a obra “contribuirá para um melhor ordenamento da Área Metropolitana de Lisboa” e defendeu que a infraestrutura “já devia estar a funcionar”. Já Inês de Medeiros elogiou o projecto, frisando que este não substituirá a necessidade de uma terceira travessia do Tejo.

A Zero discorda desta posição e sublinha que o tráfego rodoviário nos acessos a Lisboa tem aumentado de forma contínua. Segundo os dados da associação, em 1997, antes da introdução da ferrovia na Ponte 25 de Abril e da inauguração da Ponte Vasco da Gama, entravam diariamente em Lisboa cerca de 150 mil veículos vindos da Margem Sul. Em 2023, esse número ultrapassava os 217 mil veículos, evidenciando que as infraestruturas ferroviárias não conseguiram acompanhar o crescimento da procura, fruto do grande aumento populacional nos concelhos da margem sul do Tejo nos últimos 25 anos, e da redução do teletrabalho que contribuiram para um aumento da circulação automóvel.

Face a este cenário, a associação ambientalista propõe um conjunto de medidas para combater o congestionamento rodoviário e incentivar o uso do transporte público. Entre as soluções sugeridas estão o reforço da frota ferroviária com novas carruagens, um maior investimento em corredores exclusivos para autocarros nas travessias do Tejo e a introdução de portagens diferenciadas consoante a taxa de ocupação dos veículos. Além disso, a Zero defende que a terceira travessia do Tejo seja “exclusivamente ferroviária”, como tem vindo a defender ao longo dos últimos anos. A associação aponta também a inexistência de acessos dedicados ao transporte público rodoviário regular, tanto a norte como a sul das pontes, e os “gigantescos e inaceitáveis incentivos” que as empresas oferecerem a quem utiliza transporte individual (combustíveis, viatura e parqueamento), aspectos quena sua opinião contribuem fortemente para que o congestionamento das pontes se agrave de dia para dia.

Pedro Nunes, membro da Zero, alerta para os impactos negativos da aposta em novas infraestruturas rodoviárias e reforça que o caminho a seguir deveria ser o oposto. “Defendemos que a terceira travessia não tenha sequer tabuleiro rodoviário. Deveria ter um acesso único para a utilização ferroviária”, afirma. O ambientalista considera que projectos como os que o Governo pretende avançar são “indutores de tráfego rodoviário” e perpetuam um modelo de mobilidade assente no transporte individual, contrariando as metas ambientais de Portugal. “O sector dos transportes representa cerca de 30% das emissões totais de gases com efeito de estufa no país. Estamos a alimentar um modelo que está a aquecer o planeta, quando deveríamos estar a reduzi-lo”, conclui.

A ZERO defende também que o fim das concessões das pontes sobre o Tejo é uma enorme oportunidade para adoptar políticas que reduzam substancialmente o número de veículos rodoviários em circulação e “promovam uma alteração substancial do modelo de mobilidade, reduzindo a pressão sobre os recursos e trazendo justiça na utilização do espaço público nos centros urbanos da Área Metropolitana de Lisboa (AML).”

“Com o fim destas concessões, as portagens cobradas poderão financiar algumas das medidas fundamentais para a aceleração da necessária mudança no atual modelo de mobilidade, que é claramente insustentável, como é caso do prolongamento para oriente do Metro Sul do Tejo, a densificação de corredores dedicados ao transporte público rodoviário ou o robustecimento dos interfaces de transporte público tanto a norte como a sul das travessias”, pode ainda ler-se no mesmo comunicado.

Sofia Quintas

Directora e jornalista do Almada Online

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