MP acusa mulher de racismo contra filhos de Bruno Gagliasso e Giovanna Ewbank
O caso remonta a Julho de 2022, no Clássico Beach Bar by Olivier, em S. João da Caparica. Nas redes sociais, o casal comemorou a decisão da Justiça portuguesa
Os crimes aconteceram no Clássico Beach Bar by Olivier, na praia de São João, na Costa da Caparica. Adélia Barros, de 59 anos, foi acusada pelo Ministério Público (MP) de dois crimes de injúria e dois crimes de difamação com publicidade e calúnia, por motivações racistas.
A notícia é avançada pelo jornal Público, que afirma ter tido acesso ao despacho. Adélia Barros proferiu vários insultos racistas contra as crianças Chissomo (10 anos) e Blessings Ewbank Gagliasso (9 anos), que têm nacionalidade brasileira e portuguesa, bem como contra cerca de outros 15 cidadãos angolanos, que se encontravam no bar da praia. Entre os insultos proferidos estão: “Vai para a tua terra! Estamos em Portugal, não queremos cá levar com estes brasileiros filhos da p****! Vocês não são portugueses! Voltem para o Brasil! Voltem para África! Saiam daqui! Viva Portugal!”
Apesar de reconhecer os insultos racistas e que “é indiscutível” que a arguida dirigiu “aos ofendidos” e a outras pessoas “várias frases de cariz ofensivo, tendo por base a sua origem étnica ou nacional”, o MP considerou que os factos não integram “os elementos objectivos do crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência”, previstos no artigo 240 do Código Penal. Isto porque a conduta da arguida teria que ser destinada “a divulgação ou através de qualquer meio de comunicação social ou sistema informático” — o que, no entender, do MP não foi o caso.
A acusação descreve que, depois de insultar os empregados do bar, Adélia Barros dirigiu-se aos filhos do casal de actores com frases como “Seus pretos imundos!”, “Seus pretos, voltem para África!”, e “Portugal não é lugar para pretos!”, entre outros. O incidente tornou-se ainda mais perturbador quando Adélia Barros perseguiu as crianças, continuando com os insultos, mesmo na presença de outros clientes e funcionários do estabelecimento.
Embora os funcionários e os pais das crianças tivessem tentado com que abandonasse o local, a arguida continuou “a persecução racista e xenófoba iniciada junto ao bar de praia”, acusa o MP. Intensificava “as agressões verbais dirigidas às crianças, passando, também, a dirigi-las a uma família de aproximadamente 15 pessoas negras, de nacionalidade angolana, que se encontrava numa das mesas do mesmo restaurante”, refere.
Os actores confrontaram a arguida “dizendo-lhe que a sua atitude era repugnante, racista e xenófoba, e que a mesma deveria ter vergonha do seu comportamento, especialmente porque era dirigido a crianças”. Adélia Barros terá continuado e, nem com a chegada da GNR parou os insultos, incluindo aos guardas, refere o documento.
Adélia Barros estava visivelmente alcoolizada, referiram testemunhas. O seu advogado, João José Brito, não quis comentar este assunto, e referiu que ainda não sabe se vai pedir abertura de instrução do processo.
A acusação da família sublinha que o episódio afectou emocionalmente as crianças, que ficaram num estado de “medo e ansiedade”, e precisaram de acompanhamento psicológico. Pedem uma indemnização de pelo menos 35 mil euros.
Na opinião dos advogados dos actores (Rui Patrício, Catarina Martins Morão e Teresa Sousa Nunes), na acusação que o MP acompanhou estão “patentes a motivação e o carácter racista dos crimes em causa, como sempre procurámos demonstrar, com um intuito, mais do que pessoal, cultural”. Referem: “Poderia haver razões para acusar por um crime ainda mais grave, o previsto no artigo 240 do Código Penal, mas admitimos que é discutível e compreendemos a opção do MP tendo em conta a lei actual. Mas o que é importante é acentuar que já houve uma acusação penal, por crime agravado, e com o reconhecimento da questão racial e discriminatória, e haverá uma outra no futuro por contra-ordenação”.
Os advogados declaram que “se este processo puder dar um contributo para uma maior consciência social e legal em questões de combate ao racismo e à discriminação, está conseguido o principal objectivo dos nossos clientes neste processo.”
Na altura, os actores deram uma entrevista à TV Globo em que Bruno Gagliasso afirmou: “Não fique calado, não finja que não escutou. Fale, denuncie, isso é crime e as pessoas precisam de ser responsabilizadas.” Giovanna Ewbank disse não ter dúvidas de que a percepção sobre a sua atitude iria ser “diferente do que acontece com muitas outras mães que são leoas sempre em defesa dos seus filhos pretos, mas têm suas falas invalidadas”. “Eu sei que, como mulher branca, o que disse vai ser validado.”
O caso gerou uma onda de solidariedade nas redes sociais e nos media, culminando até numa manifestação de apoio por parte do Presidente brasileiro, Lula da Silva, no X. Lula escreveu que “nenhuma mãe ou pai merece ver seus filhos sendo vítimas de xingamentos racistas”. “Vamos construir um mundo sem racismo”, reiterou ainda.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa também emitiu na altura uma nota, onde reafirmou que “qualquer comportamento racista ou xenófobo é condenável e intolerável, e deve ser devidamente punido, seja qual for a vítima”.
Reacção do casal ao despacho
O casal reagiu logo a seguir nas redes sociais. “Há quase 2 anos fizemos uma acusação no Ministério Público de Portugal após nossos filhos e um grupo de angolanos serem vítimas de racismo. Racismo é crime e não pode ser banalizado. Inicialmente pedimos que a autora dos crimes fosse enquadrada em crimes previstos no artigo 240 do Código Penal Português que prevê punição para discriminação e incitamento ao ódio e à violência. A denúncia não foi aceita, mas nunca desistimos.
Hoje, podemos comemorar porque o Ministério Público aceitou nossa acusação por difamação e injúria racial e superou uma questão teórica sobre onde enquadrar o crime perante a lei. Vencemos, mas ainda é um pequeno passo. Entretanto, acreditamos que, se este processo puder conscientizar em questões de combate ao racismo, o mundo poderá, quem sabe um dia, ser mais igualitário. O próximo passo será o julgamento da racista. Esperamos voltar em breve para contar outra vitória. Porque acreditamos!
Agradecemos aos advogados portugueses Rui Patrício, Catarina Martins Morão e Teresa Sousa Nunes que permanecem ao nosso lado para que a justiça reconheça o racismo como um crime – um crime que discrimina, que fere a autoestima e não permite que pessoas negras tenham oportunidades. Um crime que mata em qualquer parte do mundo. E a gente precisa construir uma sociedade que entenda que o racismo não pode ser tolerado, nem em forma de ódio disfarçada de piada”.
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