3º dia do Sol da Caparica

Nova enchente, muitas reclamações, muita lusofonia e música até de madrugada

Nova enchente no Sol da Caparica no Sábado dia 13 de Agosto, para ver actuar ProfJam, Plutónio, Sam the Kid, Diogo Piçarra e Branko. Para além destes actuaram também Cuca Roseta, Ivandro, Kady e Convidadas, Karyna Gomes, Mário Marta, Nuno Ribeiro, Orelha Negra, Soraia Ramos & Amigos.

Na tenda eletrónica houve Karetus (interrompido a meio por opção da banda), Afrokkilerz, Zanova, Zullu & Gabily. No Palco Comédia acturam Hugo Sousa, Vasco Elvas e Mangope e, no palco Jazzy Latin Attitude e Tiago Fi, Jazzy Dance Crew e Showmen.

Reclamações ecoam no silêncio da organização

Ao terceiro dia de Festival O Sol da Caparica, registou-se ainda maior afluência de pessoas e continuaram as falhas na organização. O público continua a contestar a dificuldade em aceder ao recinto, com longas filas de espera e, os atrasos nos horários das actuações. O concerto de Karetus foi interrompido, de acordo com um comunicado da banda, por não estarem reunidas “condições de segurança”.

Na Internet as reclamações continuam a crescer. No Portal da Queixa, o Almada Online, encontrou apenas duas queixas registadas em nome da produtora do evento, o Grupo Chiado. Uma sobre os atrasos do primeiro dia e falta de comunicação dos mesmos por parte da produtora. Outro sobre a falta de estacionamento e porta de acesso para pessoas com mobilidade reduzida, que fez a queixosa desistir daentrada no recinto.

As pessoas com mobilidade reduzida têm direito e, também gostam de ir aos concertos e festivais, mas para tal é necessário existirem condições que lhes permitam esse acesso. No entanto existe uma lacuna na lei, que parece ser política geral de vários festivais. De acordo com pessoas nesta situação, o festival O Sol da Caparica não é inclusivo.

“Não tem plataformas para mobilidade condicionada em nenhum dos palcos! Apenas tem um WC de mobilidade condicionada com uma rampa vergonhosa! Sempre que precisei de ir ao WC, depois de uma hora para que me indicassem correctamente onde era, precisei de ajuda de dois bombeiros ou de seguranças ou da proteção civil para colocarem a cadeira dentro do mesmo! Nunca estive num festival tão mal organizado para pessoas com mobilidade condicionada! Não tem estacionamento próprio, não tem entrada específico para cadeira de rodas, com rampas! Não sei como a câmara municipal de Almada deixou passar todas estas falhas que não são permitidas por lei!”

Muitas outras queixas estão relacionadas com o que se pode levar para o festival. Uma falha de comunicação fez com que a equipa de segurança não deixasse entrar comida no recinto, mesmo que fossem sandes embrulhadas em papel alumínio. “Está um contentor cheio de sandes embrulhadas em alumínio, alega uma das pessoas que foi ao festival, o que fez com que quilos e quilos de comida fossem desperdiçados. Ironicamente têm uma banca da Refood no festival”, diz outro queixoso. É possível levar sandes para o recinto – não podem é ir dentro de caixas ou outros recipientes. No entanto, a informação do que era interdito levar para o recinto do festival apenas foi tornada pública no primeiro dia do festival pelas 18h, ou seja, depois de as portas abrirem.

Neste terceiro dia, também os Karetus se viram obrigados a não completar o concerto no festival. “Infelizmente não conseguimos acabar o nosso concerto no Festival Sol da Caparica. Ao longo dos últimos dias, solicitámos várias vezes a alteração do local do espectáculo, por sentirmos que o palco onde actuámos não reunia as condições técnicas, de segurança, de logística e de dimensão de forma a que pudéssemos entregar o espectáculo que todos esperavam. Essa alteração foi reiterada e consecutivamente negada pela organização. Ainda assim, por respeito ao público e por acreditarmos nas garantias asseguradas pelo promotor, tentámos fazer o concerto nas condições que nos apresentaram. Pelo bem estar de todos, a meio da actuação, tivemos de abandonar o palco, dado que não estavam reunidas quaisquer condições de segurança para continuar. Foi a primeira vez na nossa carreira que interrompemos um espectáculo”, disse a dupla na sua conta de Instagram e Facebook.

Houve um extintor que disparou dentro da tenda electrónica. Vários festivaleiros dizem ter sido um acidente devido ao calor e mau acondicionamento do mesmo. A organização afirma que um indivíduo apropriou-se de um extintor e disparou-o propositadamente. Seja como for, é algo que ninguém espera que aconteça num festival de música e, várias pessoas saíram em pânico da tenda e outras ficaram com comichão e tosse a noite toda.

Nas redes sociais, houve quem questionasse a organização se seria possível obter reembolso dos bilhetes, pois tinham supostamente adquirido bilhete para ver os artistas cancelados, sem resposta por parte da organização. No portal da queixa há quem ainda espere reembolso de concertos organizados pela mesma produtora há dois anos.

Outras queixas estão relacionadas com os preços practicados dentro do recinto para consumir alguma coisa, com as poucas casas de banho (algumas delas fora de serviço por avaria), com caixas Multibanco avariadas, com torneiras que deitam pouca pressão de água, com a fraca qualidade de som em alguns palcos, com horários extra de autocarros que não são cumpridos, com maquilhagem obrigada a ficar à porta, com filas e mais filas… Enfim, há um pouco de tudo.

Muitos moradores da Costa da Caparica têm também manifestado a sua insatisfação, que tem crescido a cada edição do festival por esta trazer a cada ano cada vez mais gente, a uma cidade de veraneio onde também reside muita gente todo o ano. Apesar de se realizar num fim-de-semana prolongado pelo feriado, muitas pessoas trabalham nestes dias, por vezes por turnos. As queixas prendem-se sobretudo com o ruído, que se agravaram este ano porque o festival tem mais um dia que nas edições anteriores e, porque o sound check é feito dias antes. Alguns caparicanos já têm por hábito mudar-se nestes dias para casa de familiares noutras localidades. Na totalidade são quase duas semanas de ruído pela noite dentro, mais sujidade nas ruas, jovens alccolizados a circularem na via pública e estacionamento desordenado.

Este ano em específico, dado a implementação da Carris Metropolitana no concelho de Almada ter deixado a Costa da Caparica com menos opções de transportes públicos rodoviários para quem trabalha, foi com um amargo de boca da população local, que se soube do reforço das carreiras, feito pela mesma operadora para o festival. Alguns trabalhadores queixaram-se de ter chegado de táxi do trabalho em Lisboa, pois algumas carreiras não se realizaram para reforçar o festival. Não conseguimos confirmar esta informação junto da operadora em tempo útil deste artigo, por ser fim-de-semana, mas iremos voltar a ele futuramente.

Desde sempre que durante o festival existem condicionamentos de trânsito, que deixam os moradores mais próximos do Parque urbano da Costa da Caparica, imposibilitados de estacionarem e transitarem de carro nas ruas onde habitam. Este transtorno tem sido colmatado pela organização com a oferta de bilhetes para o recinto.

Em relação ao estacionamento, acautelado pelos organizadores atempadamente e com várias opções ao automóvel sugeridas, foi claramente insuficiente nesta edição. Alguns municipes sugeriram opções nas reuniões da Câmara Municipal de Almada, da Junta de Freguesia da Costa da Caparica e, em vários posts online, como foi o caso de Paulo José Martins e Paulo José Silva. Pelo que conseguimos averiguar,as sugestões dos munícipes no que diz respeito ao estacionamento não têm tido resposta por parte dos organizadores do festival.

Sobre este assunto, deixamos duas fotografias que não necessitam muitas palavras.

©Facebook / Impossível a passagem de alguém com mobilidade reduzida, um carrinho de bébé ou bombeiros em caso de emergência.

©Carlos Dinis / Facebook / Fotografia deixada num dos posts da organização do festival

Nesta última fotografia, o seu autor Carlos Dinis, escreveu o seguinte num comentário da conta oficla do festival: “E o degradante espectáculo de carros estacionados em PLENA VIA RAPIDA (IC20); no acesso ao Cemitério, nos acessos às obras que se estão a realizar para a “NOVA ROTUNDA”, os quais funcionários HOJE (13 de Agosto) estiveram a ver os DANOS causados na ESTRUTURA que está ENTERRADA no SOLO, mas que tem de estar ISENTA de pesos como por EX: AUTOMÓVEIS, até tiveram a realizar EXTRAÇÃO de AGUA da dita estrutura, depois digam que o “ORÇAMENTO DERRAPOU” mais do que deve. estas entre outras aberrações como em CIMA do SEPARADOR CENTRAL RELVADO na Rua Vitimas da Guerra Colonial / Avª Afonso e Albuquerque. Façam ARRAIAIS à vontade ou até à VONTADINHA, mas NUNCA na MALHA URBANA onde os residentes / contribuintes pagantes e bem de todos os IMPOSTOS como I.M.I. e outros indiretos, que cá vivemos 365/dias ano e temos de GRAMAR com o que NOS IMPÔEM. É MEDONHO, mas pronto não podemos esquecer que vivemos no tal QUINTALZITO que teimam chamar PAÍS há mais de 48 anos. E pronto, é a tal história dos 2 pesos e 2 medidas”. Por ser fim-de-semana o Almada Online não conseguiu verificar a veracidade das declarações relativamente aos danos das obras em curso e que tantos anos demoraram a realizar-se.

A organização tem-se remetido ao silêncio, depois de no primeiro dia Zahir Assanali, produtor do Grupo Chiado ter declarado à NIT no segundo dia do festival:

“As pessoas que comentem o que quiserem. Estiveram cá 30 mil pessoas no recinto e hoje [sexta-feira, 12 de agosto] vamos receber outras 30 mil. Nós respeitamos a opinião de cada um”

Zahir Assanali, produtor do Grupo Chiado, um doa organizadores do festival O Sol da Caparica

Não se sabe o que terá causado esta desorganização este ano, mas esta edição não ficará na memória pelos melhores motivos.

Os concertos

Os concertos de Profjam, Plutónio e Sam the Kid – que voltou a reunir-se com Orelha Negra e a Orquestra – marcaram a noite. Os ritmos da nova geração, alinhados com sonoridades mais mainstream (Diogo Piçarra, nesta terceira noite por ex.), voltaram a ser fórmula de sucesso na construção de um cartaz que aposta da lusofonia.

Nuno Ribeiro abriu o palco principal. O artista que começou por se mostrar ao país com 16 anos de idade, no programa “The Voice” da RTP abriu com as “Ondas do Mar”, bastante adequado ao local. Nas suas canções trabalha refrões, emoções e energias, para um público que já conhece os seus temas. Ouviu-se, entre outros, o novo tema “Dias Cinzentos”. O músico levou ao festival os seus temas mais conhecidos e agarrou, desde logo, a audiência.

Do outro lado do recinto atuou Kady. A cantora nascida na cidade da Praia trouxe um conjunto de convidados que enriqueceram a actuação e lhe deram dinâmica: Sílvia Barros, Soluna e Nayela. Cada uma, acrescentou dois temas seus ao concerto, e também uma diversidade musical à apresentação. “Flaca”, de Soluna captou a atenção, pela combinação latino-africana. Com um percurso prévio, como voz de suporte de Dino D’Santiago, a cantora aposta agora na sua própria carreira a solo. Outra interpretação forte foi a de Kady com Nayela, sobre o cabelo afro, um símbolo da resistência negra como as próprias fizeram questão de sublinhar. Kady interpretou ainda “Diz Só” canção composta por Dino D´Santiago, com letra de Kalaf Epalanga, que levou ao Festival da Canção 2020. Fechou o concerto com “Djuntu”, em português “Juntos” e voltou a chamar ao palco as suas convidadas. “Espero que tenham gostado. Hoje vou dormir feliz” disse, antes de se retirar.

Seguiu-se, neste palco, Mário Marta, o artista de origem cabo-verdiana e guineense, que viajou pela intemporalidade do funaná.

Cuca Roseta surpreendeu todos ao abrir o seu concerto à bateria, acompanhada por Vick Marques, a interpretar “Barco Negro” de Amália Rodrigues. A fadista portuguesa tem vindo a trabalhar a tradição e as raízes populares da música portuguesa, com as quais abriu e fechou o concerto. Deu o seu toque pessoal a “Tiro-liro-liro”, “Ó rama, ó que linda rama”, “Malhão” e despediu-se com “Bailinho da Madeira”. Pelo meio, cantou músicas do seu último álbum “Meu”, feito durante a pandemia, e ainda explicou as origens do fado e cantou poemas clássicos.

ProfJam abriu em grande e assumiu o palco sozinho durante uma hora, fazendo vibrar os milhares de jovens que preenchiam o recinto do festival. “Eu sou o ProfJam, mas o meu nome civil é Mário Cotrim”, apresentou-se o músico, revelando o significado das iniciais MC no ecrã de fundo. Com a actuação a iniciar ainda de dia, o músico repartiu, com o público, muitos dos seus temas. Todos sabiam a letra e acompanharam “Xamã”, a viagem de “Malibu” e foram mesmo incumbidos de participar, no lugar de Lon3r Johny em “Damn/ Sky”. Recebeu em palco o convidado Benji Price, com quem gravou alguns temas e aqui apresentou “Finais” e “Tribunal”. Seguiu-se um discurso muito positivo sobre a importância e o valor da família e, uma canção dedicada a todas as “cotas”, as mães presentes neste festival, “À Vontade”. Antes de se despedir, cantou ainda “Tou bem” e fez o seu baptismo com “Água de coco”.

Enquanto isso, do outro lado do recinto, Ivandro levava o público à “Lua”.

No palco principal seguiu-se Diogo Piçarra, num concerto em que juntou aos seus grandes êxitos bailarinos, efeitos de pirotecnia, muita emoção e proximidade com o público. Com um “Sorriso” na cara e com o “Coração”, Diogo Piçarra elevou a energia deste terceiro dia do Sol da Caparica. Durante uma hora fez a sua “Monarquia” e dominou o palco.

Soraia Ramos, cantora de origem cabo-verdiana que tem vindo a conquistar o seu lugar no mundo da música, trouxe um convidado especial, Edgar Domingos. Conhecida pelos temas “Diz-me”, “Agora penso por mim”, “Quero-te ver mexer” ou “Bai”, confirmou o seu sucesso no Sol da Caparica.

O bairro da Cruz Vermelha esteve representado, como tem sido habitual, nos concertos de Plutónio. O rapper português foi mais um dos que teve de condensar o longo reportório de temas conhecidos no tempo de uma hora de actuação. “Prada”, “Luci Luci”, “Dramas & Dilemas” fizeram parte deste alinhamento, que incluiu também um novo tema: “Por Enquanto”.

Circular no recinto era quase impossível, perto da meia noite, mas foi possível chegar ao palco onde Branko dava cartas na Eletrónica. Como se tivesse feito a tenda ao ar livre, o público preenchia o recinto, frente ao palco, e dançava ao ritmo da batida do músico. Branko chegou mesmo a deixar os sintetizadores a tocar e a descer à grade, com o microfone, dando assim voz aos que assistiam.

O pontapé de saída para o concerto de Sam The Kid foi dado pelo seu pai, que entrou em palco a recitar um poema. De seguida, Sam The Kid surgiu e começou o seu concerto com a frase “Este é o primeiro dia do resto da minha vida”. Voltou a juntar a orquestra e Orelha Negra, tal como fez no Campo Pequeno e, com o DJ Cruzfader e Mundo Segundo deu um concerto memorável, em que partilhou a história da sua infância e do seu interesse pela música. NBC com toda a energia que lhe conhecemos, veio ainda acrescentar valor a este espectáculo. Sam The Kid uniu o público e fechou em grande o terceiro dia do Sol da Caparica.

Sofia Quintas

Directora e jornalista do Almada Online

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