Almada chegou a um bom Porto, ou melhor, a um bom Cais (do Ginjal)
Todos nós, habitantes no concelho de Almada, temos a nossa história individual ligada por algum motivo ao Cais do Ginjal e ao percurso pedestre que nos leva a Olho de Boi ou ao Jardim do Castelo, em Almada. Ou porque os nossos pais trabalhavam nas inúmeras indústrias aí presentes desde o séc. XVIII até finais da década de 70 do século passado, ou devido a passeios com amigos, namorados, família, ou pela pesca à beira-rio ou passeio de barco à vela.
A História de um bom Cais (do Ginjal)
O Cais do Ginjal, em Cacilhas, tem uma história rica e fascinante. Desde o século XIX foi um dos principais polos industriais e comerciais da região, abrigando estaleiros navais, fábricas de cortiça, armazéns de vinho e azeite, além de oficinas de reparação naval e, também, restaurantes, ou como se dizia nesses tempos idos, Casas de Pasto. Durante décadas, foi um local de grande atividade, frequentado por marinheiros e lisboetas, também chamados “alfacinhas”, que aproveitavam as famosas tabernas e tascas para ouvir fado e saborear caldeiradas.
Consta que o enólogo italiano Luigi Rossi, cofundador do que viria a ser a famosa marca internacional “Martini & Rossi”, era um assíduo apreciador da gastronomia e dos vinhos de Lisboa e, também, da Charneca de Caparica. Quando visitava Lisboa, costumava banquetear-se por Cacilhas, nas Casas de Pasto do Cais do Ginjal. Mas tudo isso é um mito urbano, sem qualquer fundamento histórico, no entanto, muito interessante e glamoroso, e que apimenta um pouco a nossa crónica, impregnando-lhe algum charme.
Todos nós, habitantes no concelho de Almada, temos a nossa história individual ligada por algum motivo ao Cais do Ginjal e ao percurso pedestre que nos leva ao Olho de Boi e ainda ao Jardim do Castelo, em Almada. Ou porque os nossos pais trabalhavam nas inúmeras indústrias aí presentes desde o séc. XVIII até aos finais da década de 70 do século passado, ou porque posteriormente ao declínio industrial da zona, esta passou a ser inspiração para passeios de amigos, namorados, famílias, pesca à beira-rio e, ainda, para o treino dos jovens de Almada na arte de navegar à vela (deixo aqui uma saudação ao Clube Náutico de Almada).
De realçar nesta história do Cais do Ginjal as indústrias do bacalhau e do vinho, que se impuseram ao estaleiro naval Hugo Perry & Sons e às corticeiras, indústrias que pelo seu crescimento tiveram de se deslocalizar para Cacilhas e Cova da Piedade (Romeira).
Após as indústrias presentes desde o Cais do Ginjal até ao Miradouro da Quinta da Arealva terem desaparecido por desmantelamento, restaram as ruínas e o vazio durante anos e anos, com as entidades que regulam este território a não se entenderem, nem a procurarem salvaguardar o interesse público, nem tão-pouco o benefício dos habitantes do concelho de Almada ou de quem nos visita.
Com esta Câmara Municipal de Almada, liderada por Inês de Medeiros, chegou a hora de dizer basta!
O Estado da Arte
Todos os almadenses reconhecem o potencial turístico do Cais do Ginjal, que não se resume à sua vista sobre o Tejo e Lisboa. O Cais do Ginjal está associado a um legado maior e a uma recordação histórica. Esta recordação é amplamente reproduzida na obra de Romeu Correia, na novela semi biográfica sobre a sua adolescência, tendo como pano de fundo o seu Cais do Ginjal dos anos 30 do século passado. O Cais do Ginjal, como não poderia deixar de ser, atravessou e atravessa o coração e o imaginário de inúmeras gerações. Temos de lhe dar o seu verdadeiro valor, que é único.
Contudo, não pode a história comprometer o presente e, sobretudo, o futuro. Não pode a história, à semelhança do que sucedeu com o incidente em 2015, quando um automóvel foi “engolido” pelo desabamento de uma parte do Cais – que já havia cedido e agora voltou a ceder – colocar em causa a segurança de todos os que usufruem daquele espaço.
No ano de 2015, há dez anos, a Administração do Porto de Lisboa e o Serviço Municipal de Proteção Civil comunicaram que “vedaram totalmente o trajeto para impedir a passagem a viaturas e peões”, tendo a reabertura do Cais ocorrer após alguns remendos no trajeto. Na altura, o executivo da CDU informava que “perante a ausência de resposta da empresa proprietária e responsável pela conservação e segurança daquela área do território do município de Almada, a Câmara Municipal irá de imediato desencadear os procedimentos necessários para a realização das obras urgentes naquele local, imputando os respetivos custos ao proprietário”. Hoje, aquela força política e todas as outras, dizem que a responsabilidade é da Câmara Socialista. Um oportunismo desnecessário e que a história se encarregará de desmontar.
Além disso, a segurança das pessoas que ocupavam aquelas construções, de forma irregular, cujo estado de conservação tinha merecido até então diversa sinalização de “perigo de derrocada” colocada pelo Serviço Municipal de Proteção Civil, não poderá, igualmente, ser colocado em causa.
Assim, após algumas derrocadas ocorridas no cais e das várias avaliações que se seguiram ao edificado e ao cais realizadas pela Proteção Civil, Serviços de Engenharia da Câmara Municipal de Almada e técnicos da Administração do Porto de Lisboa, Inês de Medeiros decretou a situação de alerta no Cais, bem como a sua interdição, a partir de 2 de abril.
Da situação de alerta a uma intervenção maior
Como é do conhecimento público, existe um Plano Pormenor do Ginjal, que entrou em consulta pública em 2017 e foi aprovado em 2020. Este Plano viu a sua concretização esbarrar no diferendo judicial entre o proprietário de grande parte do edificado (o grupo AFA) e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Entre decisões judiciais e recursos, a demora numa sentença final e os cada vez mais frequentes fenómenos naturais (sismos) e meteorológicos (depressões e outras tempestades),e sem qualquer intervenção de requalificação ou outra, o Cais do Ginjal foi-se degradando progressivamente. Face a esta situação de perigosidade e de urgência, o executivo liderado pela Presidente Inês de Medeiros, atuou com coragem e determinação.
Todos entendemos que apenas em situações limite é que a autarquia pode intervir em domínio e propriedade privada. Caso contrário, a própria liberdade particular poderia ser colocada em causa. Mas mais do que isso, face a este cenário e após a avaliação dos serviços competentes, o executivo do Partido Socialista determinou a reposição das condições de segurança, salubridade e arranjo estético do edificado, se necessário com recurso à demolição total do edificado ali existente. Nas últimas semanas, temos assistido a esse trabalho. Mas teremos ainda melhores perspetivas.
Apesar das responsabilidades da Administração do Porto de Lisboa e da Agência Portuguesa do Ambiente (entidades públicas tuteladas pelo Governo) não terem sido assumidas por estas entidades, nem no passado, nem agora, a Câmara Municipal de Almada assegurou a operação de retirada e encaminhamento social das cerca de 50 pessoas que ali viviam de forma precária – numa operação de reconhecido sucesso.
Foi também esta autarquia que notificou os proprietários dos terrenos e edifícios para realizar a intervenção de forma coerciva e, após a devida concertação, irá assegurar a reabertura à circulação no Ginjal, espera-se, no próximo mês.
Além da perspetiva de reabertura do espaço, em condições de segurança, para os almadenses e todos aqueles que visitam Almada, o executivo eleito pelo Partido Socialista encontra-se ainda a trabalhar com as entidades com responsabilidades neste processo para ver assegurado, por fim, a reabilitação desta zona ribeirinha.
Mas este executivo camarário não se tem limitado à concertação com as entidades responsáveis e com o Governo. Tem assumido a liderança deste processo e dado o exemplo. Além da operação de interdição, com impedimentos físicos, e da desocupação do cais, da ativação de uma Zona de Concentração e Apoio à População (ZCAP), a visita ao jardim do rio permite já ver a requalificação da escadaria, a limpeza de grafitis na Fonte da Pipa pela Freguesia, no âmbito do contrato interadministrativo celebrado com a Câmara Municipal e perspetiva-se, igualmente, para breve, a abertura do bar da Boca do Vento – que se encontra em obras.
Almada entrará no verão com uma grande dinâmica, e esta zona ribeirinha será devolvida aos almadenses mais rápido do que qualquer um de nós poderia esperar, e por esse motivo apenas posso agradecer à Câmara Municipal de Almada.
A verdade é que apesar dos avanços e recuos que o Ginjal presenciou desde o 25 de abril de 1974, em momento algum, na sua história recente, aquele espaço conheceu tamanha intervenção e transformação como a agora em curso. Uma transformação que deve ser acolhida de braços abertos pelos almadenses, que tanto merecem usufruir deste espaço, com as devidas condições de dignidade e segurança. Uma Almada a Construir o Futuro!
Almada Online, Crónica, Opinião, Pedro Dias Pereira, PS