Desvio de verbas na Costa: O que temem o PS e o Sr. Ivan Gonçalves? 

Importa recordar o que está em causa. Entre 20 de Dezembro de 2022 e 15 de Maio de 2023 foram transferidos €34,960.00 das contas bancárias da Tesouraria da Junta de Freguesia da Costa de Caparica para uma conta bancária pessoal do Presidente da Junta de Freguesia, o Sr. José Ricardo Martins, repartidas por 58 movimentos bancários. Estas transferências, segundo os próprios executantes, foram feitas com a autorização do Tesoureiro da Junta, o Sr. João Quintino. Os restantes vogais, o Sr. Sérgio Sousa e as Senhoras Célia Figueiredo e Maura Guerreiro, tinham conhecimento destas transferências, pelo menos, desde o dia 10 de Abril de 2022, e nada fizeram, de imediato, para as travar ou denunciar, permitindo, assim, a continuação destes desvios.

Em face do desvio de verbas que aconteceu na Junta de Freguesia da Costa de Caparica, e que agora constitui facto público e notório, exige-se do PS Almada e do Sr. Ivan Gonçalves, seu Presidente, uma posição firme e séria – a garantia de eleições antecipadas que permitam ao Povo da Costa julgar os comportamentos adoptados pelo seu Partido na gestão da Freguesia. Aquilo a que assistimos, até agora, representa um misto de silêncio e de desresponsabilização – o PS Almada e o Sr. Gonçalves não assumem as suas responsabilidades, não forçam a queda do Executivo da Junta e a convocação de eleições intercalares, e, em consequência, não asseguram que os comportamentos desviantes levados à prática pelos seus representantes cessam definitivamente. 

Importa recordar o que está em causa. Entre 20 de Dezembro de 2022 e 15 de Maio de 2023 foram transferidos €34,960.00 das contas bancárias da Tesouraria da Junta de Freguesia da Costa de Caparica para uma conta bancária pessoal do Presidente da Junta de Freguesia, o Sr. José Ricardo Martins, repartidas por 58 movimentos bancários. Estas transferências, segundo os próprios executantes, foram feitas com a autorização do Tesoureiro da Junta, o Sr. João Quintino. Os restantes vogais, o Sr. Sérgio Sousa e as Senhoras Célia Figueiredo e Maura Guerreiro, tinham conhecimento destas transferências, pelo menos, desde o dia 10 de Abril de 2023, e nada fizeram, de imediato, para as travar ou denunciar, permitindo, assim, a continuação destes desvios. Todos estes factos são hoje públicos e notórios, tendo sido reconhecidos e assumidos pelos próprios visados num órgão oficial, a Assembleia de Freguesia, e na comunicação social local e nacional. É também relevante recordar a argumentação aduzida para fundamentar estas transferências – que as mesmas se tratariam de “adiantamentos de vencimentos” do Presidente. 

Tive oportunidade de discutir este assunto com alguns juristas e autarcas muito experientes na governação de Juntas de Freguesia e de Câmaras Municipais.

Não consigo encontrar fundamento legal para que um Presidente e um Tesoureiro façam o que os visados disseram que fizeram e para que os restantes membros do Executivo tenham permitido a continuação destas práticas. Existem, neste caso, indícios do que poderá constituir um ou mais ilícitos criminais, como é o caso da prevaricação de titular de cargo político. Por um lado, pode ser argumentado que um adiantamento do vencimento constituiria um empréstimo ao Presidente a amortizar por via de vencimentos futuros, o que a Lei não permite – uma Junta de Freguesia não é um banco e não pode conceder empréstimos ao seu Presidente. Além disso, no caso de um eleito, também não há nenhuma salvaguarda de vínculo laboral futuro à Junta em causa que sirva de garantia face ao empréstimo – não há nenhum clausulado que impeça o Presidente de sair dos órgãos a qualquer momento sem restituir os valores em falta.

Também há argumentos que se fundam na explicitação da Lei, que define a periodicidade da remuneração como mensal, que poderão implicar que um adiantamento configuraria o equivalente a um subsídio. Por último, sendo esta uma Freguesia com mais de 10 mil eleitores, a remuneração deve ser garantida e transferida periodicamente pelo Orçamento de Estado – nesse caso, para adiantar os tais vencimentos que dizem ter “adiantado”, ter-se-á retirado liquidez a outras rubricas do Orçamento da Junta. Esta acção significa, na prática, desviar dinheiro do funcionamento da Junta de Freguesia – do serviço aos fregueses – para cobrir os alegados “adiantamentos”. Em sentido contrário aos argumentos que aqui exponho, os eleitos do PS alegam que, ao invés de um ilícito criminal, terá ocorrido uma mera irregularidade administrativa e que os “adiantamentos de salários” são prática comum no sector privado – ignorando que, por respeito aos princípios da Legalidade que regem a Administração Pública, não podia o Executivo da Junta de Freguesia conceder ao seu Presidente um Direito (o alegado adiantamento ou empréstimo do vencimento) que não decorresse de preceito legal existente (que manifestamente não existe).

A concessão desse Direito por mera autonomia de vontade do Executivo (o que seria plausivelmente legítimo no sector privado, mas não na Administração Pública) parece-me justificar, plenamente, a abertura de um inquérito pelos órgãos de investigação criminal. Acresce ainda que, recebendo a Junta de Freguesia dinheiros do Município de Almada, por via dos acordos de delegações de competências, poderá também o próprio Município ser parte lesada neste caso. Não entendo a aparente indiferença manifestada pela Presidente da Câmara, a Sra. Inês de Medeiros, nas suas declarações à comunicação social. 

Este desvio de verbas foi discutido publicamente pela primeira vez na Assembleia de Freguesia da Costa de Caparica de 30 de Junho de 2023, quando já era de conhecimento relativamente geral na cidade e, sobretudo, nos meandros da política local. Devia, nesse mesmo dia, ter havido uma deliberação imediata para que fosse feita, pela própria Assembleia, uma comunicação à Polícia Judiciária. 

Desde sempre manifestei muita preocupação com comportamentos desviantes como estes. Nada disto honra a Política e tudo isto afasta os eleitores dos eleitos. Porém, por se tratar de um caso que acontece na minha terra, Almada, este marca-me mais do que outros. Os autarcas – os políticos de Almada – têm de assumir as suas responsabilidades. Tenho mantido contacto permanente com os órgãos do meu Partido e devo reconhecer orgulho em ver que o PSD foi o único Partido a apresentar uma queixa-crime junto das autoridades competentes, incluindo no DIAP de Almada. Agora é com o Ministério Público e com a Polícia Judiciária – terá de ser a Justiça a apurar se, face aos factos, há ou não conformidade com a Lei. 

Do ponto de vista ético e político, a denúncia é o único caminho que a oposição responsável liderada pelo PSD pode seguir. Permitir que situações destas se perpetuem em Almada e no País sem o seu cabal esclarecimento – doa a quem doer – é contribuir para a já evidente degradação das Instituições e do Estado de Direito. Do conflito de lealdades entre a fidelidade à conveniência política ou pessoal e a lealdade às convicções e à consciência, só esta última pode sair vencedora. Hoje como ontem, é preciso limpar a Política e assegurar condições mínimas de salubridade para a sã vivência da comunidade.

O PSD denunciou o caso às autoridades, apresentou uma moção de censura que foi aprovada, exigindo eleições antecipadas, e estará pronto para governar a Costa de Caparica com responsabilidade e com um projecto de verdadeira mudança quando essas eleições acontecerem. Apesar da aprovação dessa moção de censura, a Lei não lhe confere efeitos vinculativos e o Executivo em funções recusa demitir-se. 

Em sentido contrário, o PS Almada e os seus chefes, mais uma vez, não deram provas de honestidade intelectual, de verticalidade ética, de coragem para decidir, e de verdadeira intenção de mudança. Parecem profundamente desorientados. A Sra. Inês de Medeiros ignorou o caso, apesar do Município ser parte interessada, porque transfere verbas para a Junta de Freguesia por via das delegações de competências. O Sr. Ivan Gonçalves mantém-se em silêncio, tendo apenas referido que iria retirar a confiança política ao executivo da Junta de Freguesia. Acresce ainda que os Presidentes de Junta de Freguesia são também, por inerência, membros da bancada do PS na Assembleia Municipal (a que o Sr. Gonçalves preside) com direito a voto e com esse voto suportam a governação da Câmara Municipal. Ou seja, o representante deste Executivo na Assembleia Municipal é membro da bancada municipal do PS e suporta activamente a governação da Câmara Municipal. Já alguém viu o PS e o Sr. Gonçalves declararem que recusam o voto do representante desta Junta? 

Perante isto, serei franco – esta retirada de confiança política (seja lá isso o que for…) parece-me um número de circo sem consequências nenhumas para ninguém e executado por alguém que não quer, verdadeiramente, tomar uma decisão com desprendimento pelo poder. A tentativa de dissimulação foi tal que o Sr. Gonçalves disse ter instruído os seus eleitos na Assembleia de Freguesia da Costa de Caparica para apresentarem uma proposta de auditoria às contas da Junta. Talvez o leitor não o saiba, mas essa proposta, mesmo que tenha sido aprovada, não passa de uma recomendação que poderá, ou não, ser acatada pelo Executivo (o tal que cometeu as irregularidades e que não terá nenhum interesse em que a auditoria se realize). Além disso, requerendo a contratação de serviços externos, a sua execução exigirá uma alteração orçamental, sendo extemporânea e estando, também ela, ferida de irregularidade (no limite, apenas o Executivo poderia propor uma alteração ao seu Orçamento, não podendo a Assembleia aprovar uma medida que altera, objectivamente, o Orçamento para o ano em curso). 

Mesmo que se venha a apurar que não ocorreu nenhum crime, há sérios problemas éticos e de transparência neste caso. Por isso, para terminar, serei curto e grosso – se o Sr. Gonçalves e o PS Almada quiserem tomar a única decisão consequente com o discurso de seriedade que apregoam, recomendarão vivamente aos seus eleitos na Assembleia de Freguesia da Costa de Caparica que se demitam – todos – para que, assim, se force a realização de eleições antecipadas. É que, uma vez que o Executivo recusa demitir-se, o único caminho para a antecipação das eleições é surgir uma situação de inexistência dos números de eleitos e suplentes mínimos para se assumirem os mandatos existentes na Assembleia de Freguesia. 

O que temem o PS Almada e o Sr. Ivan Gonçalves? 

Esperemos pela Justiça e pelo bom senso dos chefes do PS Almada. 

Post scriptum: Da mesma forma que apelo à Justiça num caso em que manifestamente se exige que intervenha, não posso não criticar frontalmente certos agentes da Justiça que não honram a profissão com que se ocupam. Conheci o Rui Rio muito antes de se tornar Líder do meu Partido e nele acreditei desde o primeiro dia. Já depois, em 2017, tive o gosto de o receber em Almada para um jantar-conferência sobre o Poder Local. A conversa que tivemos nessa noite e a exposição que fez moldaram muito do que ainda hoje é o meu pensamento político para Almada e para o País, sobretudo nos temas da Habitação e da Acção Social. Foi com naturalidade que, em 2018, a Comissão Política da JSD Almada a que eu presidia foi a única estrutura partidária do distrito de Setúbal que deliberou declarar-lhe apoio público nas eleições directas que disputou com Pedro Santana Lopes. Fui seu mandatário e/ou director de campanha em três eleições consecutivas. Declarei sempre, como continuo a declarar hoje, que Rui Rio era “a minha escolha para Primeiro-Ministro de Portugal – porque acredito no seu perfil de seriedade e trabalho, no que tem vindo a demonstrar na sua vida pessoal, política e profissional”. Foi por isso com estupefacção e revolta que assisti ao que o Ministério Público, a Polícia Judiciária e um qualquer Juiz de Instrução decidiram, sem quaisquer motivos aparentes, fazer-lhe há algumas semanas atrás. Nunca vi um político ser tão atacado como o é o Rui Rio. Não era nascido quando Cavaco Silva entrou na política, mas já me contaram que também o era. Talvez o facto de nem um nem outro pertencerem às elites de Lisboa e de ambos terem tido a força e perseverança de se fazerem valer por si próprios os una nessa curiosidade, apesar das diferenças. O mesmo se terá passado com Sá Carneiro. Ponho as minhas mãos no fogo pela honestidade e verticalidade do Rui Rio, que deixou no PSD, no Porto e no País um legado de frontalidade e de seriedade. É legítimo discordar das suas posições políticas, mas a tentativa de humilhação com que alguns agentes do Estado o decidiram presentear deve unir-nos num grito de revolta. É preciso reformar a Justiça e o Estado de Direito. E, no PSD, também é esse o legado que nos deixou Rui Rio – Se Luís Montenegro não mostrar a coragem necessária para mudar o País, um dia acordaremos com o neo-fascismo do Chega no poder (e até lhe podia chamar neo-nazismo, mas não lhes darei esse gosto). E, como bem cantava Elis Regina, quando eles vencerem, ainda seremos os mesmos, e viveremos como os nossos pais (e avós!).

, , , ,

David Cristóvão

Eleito do PSD na Assembleia da União de Freguesias de Caparica e Trafaria