É assim que me querem fazer a folha
Tudo começou quando aqui critiquei os orçamentos da Câmara Municipal e dos SMAS para 2023 e assim causei incómodo ao Partido Socialista e a quem deste depende e o ajuda.
Fui pela primeira vez autarca em substituição, pelo PPD/PSD, na Assembleia de Freguesia da Charneca de Caparica e Sobreda durante o mandato de 2013 a 2017. Depois disso, fui o candidato do PPD/PSD a Presidente da Junta de Freguesia de Caparica e Trafaria em 2017 e em 2021. Nos últimos 7 anos mantive-me como eleito nesta Assembleia de Freguesia, onde procurei defender como melhor sabia os interesses das nossas populações.
Desde 2013, primeiro na Charneca de Caparica e na Sobreda, e depois, desde 2017, na Caparica e na Trafaria, mantenho intervenção pública e escrutinável no nosso concelho. No panorama nacional, ainda antes disso, em 2012, fui pela primeira vez dirigente partidário, assumindo um cargo na coordenação nacional dos Estudantes Social Democratas. Ao longo dos anos, nas diversas posições locais, distritais e nacionais que exerci, pautei sempre a minha actuação por uma dedicação inatacável à nossa comunidade e, em especial, ao concelho de Almada, numa lógica de compromisso e de defesa da dignidade da pessoa humana e da justiça social. Exerci todos os mandatos que me foram confiados de forma incorruptível, impoluta e rigorosa. Nunca exigi dos outros menos do que exigi de mim próprio, e sempre soube que o rigor que exijo aos outros é apenas o mínimo que me poderá ser exigido.
Ao longo do último ano e meio percebi que, inegavelmente, o rigor e a transparência que defendo na acção política não é partilhado por todos. Apesar de continuar a pensar que a maioria dos agentes políticos age com honestidade e seriedade, pude testemunhar situações, comportamentos e padrões que violam o meu código de valores e com os quais não estou disposto a compactuar. Procurei denunciar e combater todas essas circunstâncias em que os interesses pessoais se sobrepuseram ao interesse público. Infelizmente, ao fazê-lo, sofri as consequências de um saneamento político injusto e injustificado.
Tudo começou quando aqui critiquei os orçamentos da Câmara Municipal e dos SMAS para 2023 e assim causei incómodo ao Partido Socialista e a quem deste depende e o ajuda. À época, demonstrei matematicamente que os aumentos nas tarifas de água e de saneamento seriam brutais. Disse também que a tão propalada descida do IMI teria um impacto médio de apenas 7€ por mês para uma esmagadora minoria de famílias. De facto, a descida do IMI não compensaria, sequer, um mês de aumentos nas tarifas da água. Assim foi. Apesar de ter sido acusado de mentir, o tempo veio confirmar que tinha integralmente razão e que o que se passou foi um esbulho.
O incómodo causado ao Partido Socialista, que colocava em causa a posição de algumas pessoas que suportam o governo socialista na Câmara, levou a que um grupo de pessoas alinhadas com aquele executivo me convocassem para uma espécie de “tribunal plenário” onde fui, sozinho, confrontado por 12 pessoas sobre as posições que havia assumido. Nesta reunião, onde fui forçado a permanecer até de madrugada, fui alvo de uma inquisição ao estilo soviético a que, infelizmente, não consegui escapar. Quiseram vergar-me e, confesso, não foi fácil aguentar a pressão.
Apesar do “aperto”, decidi manter o meu código de valores e de princípios e o meu comportamento não se alterou. As minhas denúncias sobre a falta de transparência e a manutenção do estado das coisas foram públicas. Fiz saber a minha preocupação com a forma como são usados os recursos do município e critiquei circunstâncias a que um jornal nacional chegou a chamar “Tutti-Frutti PS-PSD em Almada”.
Enunciei várias nomeações que, apesar de potencialmente legais, considero atentarem contra o código de ética que se exige em funções públicas, entre as quais destaco dois exemplos: um vereador que tem como seu adjunto um deputado municipal que, portanto, é o fiscalizador e o fiscalizado, sendo até Presidente da Comissão da Assembleia Municipal que fiscaliza directamente o trabalho do vereador para quem trabalha; uma vereadora em substituição que exerce as funções de secretária do vereador que substitui, donde comicamente se poderá dizer que ocupa as funções de secretária de um cargo que, ocasionalmente, ocupa.
Falei ainda sobre a utilização de carros do município em actividades da vida privada de membros do gabinete de um vereador, sendo hoje facto público e notório que estes foram utilizados para transportar à pendura membros do seu gabinete e, até, para transportar “namoradas”. Esta utilização indevida foi confirmada publicamente por outros autarcas, que não se coibiram de a criticar na comunicação social. Vejo com curiosidade que se fala agora pelos serviços na alteração do regulamento de usufruto destes veículos em consequência destas denúncias – e, segundo apurei, ao invés de se penalizarem estas práticas, as alterações virão no sentido de facilitar a utilização dos veículos em actividades da vida pessoal dos membros de gabinetes.
Mas o que fez estalar, definitivamente, o verniz, foi a minha exigência de uma reacção forte e determinada ao desvio de verbas públicas que aconteceu na Junta de Freguesia da Costa da Caparica governada pelo Partido Socialista. Questionado sobre este desvio de 35 mil euros do erário público para a conta pessoal do Presidente da Junta, considerei à imprensa que deveria ter havido uma deliberação imediata para que fosse feita, pela própria Assembleia, uma comunicação à Polícia Judiciária e que “os autarcas – os políticos de Almada – têm de assumir as suas responsabilidades e têm agora uma renovada oportunidade de comunicar esta situação à Polícia Judiciária para que se esclareçam todas as dúvidas – se o que foi feito está conforme a lei ou não”. Como é conhecido, a “oposição” refém do Partido Socialista hesitou, e só decidiu expor o caso ao Ministério Público depois de eu próprio ter declarado que tomaria a iniciativa de fazer essa comunicação caso os órgão locais não o fizessem. A minha intenção de denunciar este desvio de verbas e de confrontar o poder socialista instalado, mais uma vez, incomodou quem me queria fazer a folha.
Foi assim que chegámos a Novembro de 2023. Nessa altura, um grupo de pessoas visadas pelas minhas denúncias e críticas decidiram propor que me fosse retirada a confiança política da Comissão Política Concelhia de Almada do PPD/PSD. Fui imediatamente muito claro: “nada do que afirmei até hoje é falso ou pode ser desmentido. Pelo contrário, todos os factos que expus, interna e externamente, públicos e notórios, visaram salvaguardar a honra e o bom nome do PSD”. Ontem como hoje, não aceito comportamentos desviantes por parte de qualquer agente político. As minhas críticas e denúncias eram conhecidas e deixei-as por escrito dois anos antes, em 2021, numa missiva à direcção concelhia do Partido. Nesse ano nem sequer me responderam – assumo que assim foi porque, naturalmente, o que afirmei nessa missiva era inconveniente.
Como diz o povo, quem cala consente.
Numa votação praticamente empatada, de 5 pessoas contra 4 (entre estes 4 o Presidente e o Vice-Presidente da Concelhia e o Presidente do Núcleo da Costa da Caparica), decidiram retirar-me a confiança política do Partido. De imediato tomei a liberdade de procurar a impugnação da decisão junto dos órgãos jurisdicionais próprios, não tendo ainda sido notificado de qualquer decisão. Solicitei também a abertura de um inquérito disciplinar e de uma sindicância à Comissão Política por irregularidades processuais várias e pelo carácter difamatório do comunicado que a meu respeito emitiu. Vale também sempre a pena recordar que esta votação em que me fizeram a folha foi decidida pelas mesmas pessoas que eu tinha criticado nas minhas denúncias.
Tomada a decisão, foi dela dado conhecimento à Presidente da Assembleia de Freguesia da Caparica e Trafaria. Esta Presidente, que depois disto alinhou em todos os esforços para me silenciarem, ocupa as funções de adjunta da vereadora da Protecção Civil na Câmara Municipal de Almada – que critiquei abertamente aquando do processo de realojamento do Segundo Torrão (até há quem ache engraçado que esteja tudo ligado, mas eu não sou de intrigas).
Assim, na primeira Assembleia de Freguesia após a tal comunicação, deparei-me com uma cadeira e uma mesa fora da bancada do PPD/PSD. Explico: Tendo chegado antes do início dos trabalhos, coloquei devidamente os meus pertences na mesa da bancada do Partido pelo qual fui eleito. Tendo-me ausentado por breves momentos, regressei para encontrar os meus pertences removidos para uma outra bancada, onde me disseram que ficaria sentado por ter passado a ser “independente”. Naturalmente que contestei esta decisão da Presidente socialista e que tratei de juntar as mesas que haviam sido separadas. Não sou independente. Depois de um impasse e de se consultarem os serviços jurídicos e o próprio Partido, foi-me dada razão e foi comunicado à Assembleia e à população que, à luz da legislação e do Regimento, nada se havia alterado e que eu continuaria a integrar a bancada onde estou desde 2017. Está gravado.
Desde então, nunca foi apresentado qualquer argumento que pudesse contestar a minha liderança naquela bancada, desde logo porque é evidente o princípio da hierarquia e da representatividade (sou o primeiro eleito e a ordem dos candidatos é deliberadamente escolhida para reflectir a hierarquia e a representatividade dentro da candidatura, sendo o primeiro nome notoriamente aceite como o líder da candidatura e o seu principal representante), por princípios gerais e do direito administrativo, como a continuidade e a eficiência administrativa (para evitar impasses e garantir a continuidade das instituições, o primeiro da lista, sendo o mais votado e o candidato a Presidente, assume automaticamente a liderança, não havendo qualquer disposição em contrário), e por uma interpretação sistemática e teleológica das disposições sobre a organização das autarquias previstas na Lei n.º 75/2013 e, naturalmente, por uma questão de precedente e prática comum (o primeiro eleito tem sempre assumido automaticamente a liderança da bancada, nunca tendo ocorrido qualquer eleição para a função, devendo essa prática continuar a ser seguida na ausência de regras específicas em contrário).
Ora, apesar de não haver qualquer fundamento para o meu saneamento, ressurgiram recentemente tentativas de silenciamento, procurando condicionar a liberdade com que exerço o mandato para o qual fui eleito. Tratarei agora de explicar como.
Como é público e notório, contesto a decisão de encerramento da Escola Básica da Fonte Santa, que considero insensível, injustificada e, até, estúpida. Liderei, na Assembleia de Freguesia, um movimento que permitiu a aprovação unânime de uma posição de princípio contra o encerramento da Escola, e a criação de uma Comissão Eventual para o seu acompanhamento e para a análise dos temas da Educação na Freguesia. Há muito por fazer na área da Educação e o requerimento aprovado em Assembleia estabelece claramente o prazo de junho de 2024 para a entrega de um primeiro relatório preliminar sobre a Fonte Santa.
O que se passou, entretanto, é ridículo e inaceitável – Sendo necessário dar posse aos membros desta Comissão, indiquei-me, naturalmente, como sendo o representante do PSD nestes trabalhos. Dei conhecimento dessa indicação à outra eleita do PSD, que entretanto, e sem o meu conhecimento, se indicou também como a representante do PSD, criando um impasse de fácil resolução – a indicação do líder da bancada prevaleceria e esta última seria desautorizada. A Comissão acabou por ser nomeada com o meu nome e dela fiz parte até que, na véspera da primeira reunião, fui informado por um eleito da CDU de que tinha recebido um e-mail retirando-me da Comissão e entregando o meu lugar a outra pessoa. Naturalmente questionei o que se passara e as explicações que se seguiram foram tão exóticas como surpreendentes.
Argumentou a Presidente socialista que questionou directamente a Comissão Política do Partido (a tal que votou 5-4) sobre a quem deveria dar posse. Esta Comissão Política, que sustenta a posição municipal a favor do encerramento da Escola, sabendo que eu nunca seria a favor, decidiu “mandar” retirar o meu nome e substituí-lo por outro. Só fui informado depois do facto consumado e através de terceiros. Naturalmente que considero esta decisão e este procedimento ilegais e que os questionei de imediato, sustentando a minha posição jurídica. É nosso entendimento que ocorreu a violação do Princípio da Autonomia do Mandato, consagrado na Constituição, na Lei dos Partidos Políticos e no Regime Jurídico das Autarquias, tendo a decisão constituído uma intervenção indevida que poderá configurar abuso de poder e prevaricação. Entreguei, em conjunto com o meu Requerimento, um parecer da CCDR do Centro que sustenta a minha posição. Até hoje, a minha argumentação não foi contestada, tendo a Presidente decidido suspender a Comissão (o que não tem qualquer legitimidade para fazer) enquanto espera por um parecer jurídico que lhe possa ser, ou não, favorável. Estão claramente a bloquear os trabalhos da Comissão, algo que na realidade sempre quiseram, prejudicando o interesse público.
Esta não é, porém, uma situação isolada. Como é público, ocorreu este mês uma reunião de Assembleia que chumbou, ao contrário das intenções do PS, os novos acordos de descentralização e delegação de competências para a Junta. Estes acordos não foram previamente negociados com os partidos da oposição e não são bons para as populações – transferem para uma Junta sem receitas e com problemas de tesouraria uma panóplia de competências que não tem, nem terá, meios para executar. Os meios que os protocolos transferem para a Junta são claramente insuficientes e a sua aceitação só se explica por subserviência da freguesia ao PS municipal. Aliás, nenhuma outra Junta de Freguesia, três delas governadas pelo PS, aceitaram estes novos acordos propostos pela Câmara Municipal. A Junta da Caparica e Trafaria é a única que insiste na sua aprovação.
Depois do chumbo destas propostas numa primeira sessão, a Junta terá decidido convocar uma Conferência de Líderes para a qual convocou os “líderes” das bancadas representadas na Assembleia de Freguesia. Terá com esta reunião pretendido “virar” algum voto que permitisse a aprovação dos documentos inalterados. Para tal emitiu uma comunicação no dia 12/06/2024 convocando os Partidos a estarem presentes no dia 17/06/2024. Soube desta reunião no próprio dia 17, já depois da reunião, e através de membros de outros Partidos. Como se demonstra, a Presidente da Assembleia, não está sozinha nas suas tentativas de silenciamento – é que esta convocatória é assinada pelo próprio Presidente da Junta em substituição e terá sido enviada para alguém que, ao invés de me dar conhecimento da missiva, decidiu ocultar-ma e usurpar as funções que legitimamente desempenho.
Não pode valer tudo na prossecução dos interesses pessoais e partidários. É por isso que todos estes desenvolvimentos terão de ter consequências, e que procurarei agir em conformidade. Há uma teia de interesses que pretende bloquear o funcionamento das instituições democráticas em Almada, e na Caparica e Trafaria. Arrisquei confrontar o poder instalado e estamos todos a assistir às consequências desse confronto. Infelizmente, essas consequências são também para as populações, que sofrem com os bloqueios institucionais que não permitem resolver nada.
Não nos devemos esquecer que tudo isto é feito em nome de um acordo interpartidário que não existe, que nunca foi escrito, nunca foi assinado e tampouco foi aprovado pelos militantes dos Partidos.
É feito em nome de quê?
Há muitos outros autarcas que não se revêem nestas circunstâncias. Amanhã como ontem procurarei estar sempre ao lado de quem luta pelos legítimos interesses das populações e não pelo seu próprio umbigo. Podem continuar a tentar, mas não permitirei que me façam a folha.
Garantidamente.
Post-scriptum: A insistência na aprovação das novas competências é tanta que o PS acordou com os seus ajudantes a marcação de uma nova Assembleia para amanhã, sábado, com o objectivo de aprovar os documentos inalterados. A pressa e a falta de jeito nessa convocatória deu lugar a uma convocatória ilegal que não cumpre os requisitos mínimos para que a sessão possa acontecer. Requeri esta tarde, ao abrigo da Lei e do Regimento, a anulação dessa convocatória. Dei conhecimento desse requerimento à Direcção-Geral das Autarquias Locais. O requerimento foi também subscrito pela CDU. Entretanto, e face às evidentes razões que aduzi, a reunião foi desconvocada. Perdeu-se tempo porque não souberam fazer bem as coisas, ou porque não as quiseram fazer bem. Mais uma vez, o PS empatou as instituições e lesou o interesse público.
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