Transtejo adjudica novamente baterias à Astilleros Gondán
O concurso público foi ganho pela mesma empresa a quem o Tribunal de Contas impediu o ajuste directo, por um preço superior
Depois do “chumbo” do Tribunal de Contas ao ajuste directo para aquisição de nove baterias para a nova frota de navios eléctricos, a Transtejo já realizou o concurso público prometido e, seleccionou a mesma empresa, que ofereceu um desconto de 250 euros sobre o preço máximo, de 16 milhões de euros.
A Transtejo selecionou a espanhola Astilleros Gondán para o fornecimento de baterias para a sua nova frota de navios eléctricos, que serão fabricados pela mesma empresa. O concurso, lançado em Julho, com um preço-base de 16 milhões de euros, já fechou, com a adjudicação do contrato público àquela empresa, por 15.999.750 euros. Ou seja, um desconto de 250 euros, ou 0,0015%, face ao preço máximo do caderno de encargos.
Na práctica, saiu vencedora a mesma empresa a quem o negócio tinha sido entregue por ajuste directo, por um preço ligeiramente inferior, e com condições análogas, contrato esse que acabou chumbado pelo Tribunal de Contas (TdC), forçando ao lançamento de um concurso público.
O novo contrato foi publicado há dias, a 7 de Setembro, no portal Base, indicando que o procedimento contou com apenas dois concorrentes, a Astilleros Gondán, e a Oceântia Lda, esta última uma empresa portuguesa criada no final de 2020 e que comercializa autocarros eléctricos.
Ao Expresso a Transtejo revelou que a oferta da Oceântia foi de 15.999.999,00 euros (ou seja, apenas um euro abaixo do limite do concurso). A empresa adiantou ainda que “o contrato com a Astilleros Gondán, S.A. foi celebrado no passado dia 7 de Setembro, tendo sido já remetido para visto do Tribunal de Contas”.
Esta adjudicação permitirá à empresa pública avançar com o equipamento dos navios previamente encomendados à Astilleros Gondán, depois de um processo polémico, que foi “chumbado” em março pelo Tribunal de Contas, condenando a forma como a Transtejo aceitou comprar 10 novos navios eléctricos, dos quais nove sem as respectivas baterias. “É como comprar um carro sem motor”, escreveu então o Tribunal de Contas.
Os juízes do Tribunal de Contas remeteram as suas conclusões para o Ministério Público, e de imediato a administração da Transtejo apresentou a demissão.
A ex-presidente da Transtejo, que classificou como “ofensivas e ultrajantes” as considerações do Tribunal de Contas, foi ouvida esta Quarta-Feira na Assembleia da República, na comissão de economia, a pedido de vários partidos, para falar precisamente sobre o polémico negócio de aquisição de navios eléctricos e baterias. Na Quinta-Feira será a vez da actual presidente da Transtejo, Alexandra Carvalho, ir ao Parlamento falar do mesmo assunto.
O contrato de aquisição das baterias agora publicado no portal Base prevê que a primeira das nove baterias seja entregue pela Astilleros Gondán até ao final de Outubro deste ano, devendo outras duas baterias ser fornecidas até ao final de Novembro. Mais dois equipamentos terão de estar prontos até final de Fevereiro de 2024, outros dois até final de Abril e os últimos dois no fim de Junho do próximo ano.
O valor agora contratualizado, de quase 16 milhões de euros, praticamente esgota a dotação da Transtejo para este efeito. No final de Maio o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, assinou a portaria autorizando a realização dessa despesa, que acabou por sair bem mais alta do que os 10 milhões de euros que eram estimados no início de 2022.
Para pagar este investimento, a Transtejo poderá utilizar 6,8 milhões de euros do Fundo Ambiental, vindo os restantes 9,2 milhões de euros do financiamento próprio da empresa pública.
Os 16 milhões de euros das baterias acrescem aos 52,4 milhões de euros já desembolsados pela Transtejo com a compra dos 10 navios eléctricos propriamente ditos, um dos quais já chegou e é o único que vem equipado com bateria para testes.
Em Maio o secretário de Estado da Mobilidade Urbana, Jorge Delgado, afirmava que o Governo queria desenhar um concurso competitivo para as baterias, depois de o Tribunal de Contas ter chumbado o ajuste directo daqueles equipamentos à Astilleros Gondán por 15,5 milhões de euros.
“Socorremo-nos de apoio técnico adicional, nomeadamente do INESC TEC do Porto, para nos ajudar a parametrizar o que queremos comprar, por forma a que seja o mais concorrencial possível e possam aparecer diferentes players a apresentarem-se como fornecedores daquele produto”, explicou Jorge Delgado, o secretário de Estado da Mobilidade Urbana, em entrevista ao Jornal de Negócios e à Antena 1, publicada a 15 de Maio.
Contudo, o concurso, lançado a 17 de Julho, acabou por ter somente dois concorrentes, incluindo a Astilleros Gondán, que é a empresa que já está a fabricar, nas Astúrias, os navios que serão utilizados pela Transtejo, cada um com capacidade para 544 passageiros.
Estaleiros de Peniche constestaram concurso dos navios
O procedimento de contratação dos navios eléctricos pela Transtejo já havia sido contestado em 2021 pelos Estaleiros Navais de Peniche (ENP), que acusaram a empresa pública de usar um “subterfúgio” para escolher a proposta da concorrente espanhola, nomeadamente o de partir a aquisição em duas tranches distintas: os navios e as baterias.
Embora a opção de contratar 10 navios e um conjunto de baterias tivesse tido uma proposta mais barata da Astilleros Gondán (52,4 milhões de euros, face aos 56,9 milhões da ENP), a concorrente portuguesa argumentou que a alternativa apresentada para o fornecimento de 10 navios e 10 conjuntos de baterias saía mais barata na proposta dos Estaleiros de Peniche (64,4 milhões de euros, face aos 66,8 milhões cobrados pela empresa das Astúrias). Uma terceira empresa entrou na corrida, a Majestic Holland Shipyards, mas foi excluída.
Na sua resposta ao Tribunal de Contas, a Transtejo defendeu a opção de separar a compra dos navios da aquisição de baterias. “Sendo os acumuladores eléctricos considerados como equipamento de desgaste, e, portanto, de vida útil inferior à de cada unidade (mínimo de 7 anos, conforme peças do procedimento), serão objecto de um concurso autónomo para o fornecimento das baterias necessárias à operação dos navios, não sendo assim integradas no presente fornecimento”, apontou a empresa.
A Transtejo afirmou ter tentado adquirir as baterias diretamente junto do fabricante que cumpria as especificações para os navios, a Corvus Energy, mas os dois procedimentos lançados em Abril e Junho de 2022 ficaram desertos, o que levou ao posterior ajuste directo à Gondán.
Ao Tribunal a empresa pública salientou que “apenas as entidades que colaboraram como adjudicatário na concepção do projecto, em particular a Corvus Energy, possuem a capacidade técnica para fornecer os conjuntos de baterias para todos os navios capazes de se adequar à solução escolhida no âmbito do concurso público” dos navios eléctricos, acrescentando que “não há no mercado outro fornecedor possível que não os que definiram a solução escolhida no referido concurso público”.
Almada, Astilleros Gondán, Dossier Transtejo/Soflusa, transportes, transportes colectivos, transportes fluviais, Transportes públicos
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