A CDU de Almada enlouqueceu

Depois de oito anos aos berros um com o outro – PS e CDU trocaram acusações ferozes desde 2017 – eis que de repente aparecem de mãos dadas, jurando estabilidade e amor eterno.

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Há romances, ainda que eroticamente escaldantes, condenados desde o primeiro beijo. A coligação PS-CDU que desgoverna Almada pós-autárquicas de 2025 encaixa-se nessa categoria: um caso de amor tórrido na aparência, mas profundamente tóxico, daqueles que começam em juras de paixão e acabam em gritos de “divórcio!” antes das bodas de papel. Depois de oito anos aos berros um com o outro – PS e CDU trocaram acusações ferozes desde 2017 – eis que de repente aparecem de mãos dadas, jurando estabilidade e amor eterno. Quem diria? Almada assistiu, boquiaberta, aos tradicionais votos matrimoniais serem trocados por um “até que os inimigos mortais nos unam”. Só faltou o Elvis Presley a oficializar este casamento hipócrita e de conveniência política.

No papel, PS e CDU anunciaram um matrimónio “pela estabilidade do concelho” – este foi o mantra recitado como voto nupcial. Na realidade, foi como se o cão e o gato decidissem dividir a mesma casota – desconfortável e contra natura.

A CDU de Almada, outrora guardiã rígida da moral e dos bons costumes autárquicos, parece ter enlouquecido de vez. Afinal, passou anos a jurar que jamais se deitaria na mesma cama que o PS. A deputada Amélia Pardal que o diga: a veterana autarca comunista repetia que Almada “merece mais” do que a gestão desastrosa do PS. José Lourenço, outro camarada de longa data, não ficava atrás nas críticas – condenava o “abandono” e a “falta de rumo” trazidos pela baronesa Inês de Medeiros e seus ajudantes. Pois bem, 2025 trouxe-nos este triste espetáculo em que os moralistas trocaram alianças com os pecadores e o próprio José Lourenço é agora ajudante da dona Inês de Medeiros. Quem os ouviu e quem os ouve… Pardal e Lourenço engolem sapos tamanho XXL enquanto sorriam ao lado da sua outrora arqui-inimiga. Hipocrisia? Não; imagine-se, que seria!

Para garantir a lua-de-mel, dividiram bens e tarefas como num contrato pré-nupcial. A CDU ficou com alguns “presentes” no enxoval – pelouros para finalmente mostrar serviço. Ficou com as pastas da Higiene Urbana e Frota, o que na prática é a área do lixo – ironia suprema para quem passou anos a vociferar contra a “porcaria” deixada pelo PS nas ruas de Almada. Agora, quem limpa a porcaria? A noiva comunista, de esfregona na mão, porque o noivo socialista lhe disse “querias tanto a cidade limpa, toma lá o balde e a vassoura”.

Receberam também Intervenção Social e Saúde, e o Movimento Associativo e Casa das Associações, pastas que a CDU outrora acusava o PS de negligenciar. Basicamente, a mensagem foi: “Provaste do nosso veneno durante anos? Agora cozinha com ele”. Mas o mais dourado dos anéis de casamento foi a presidência dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento (SMAS), entregue a Luís Palma, vereador da CDU, como parte do dote nupcial. A CDU festejou isto como se fosse uma lua-de-mel nas Maldivas – afinal, recuperar poder após oito anos a ver navios dá uma sensação morna de vitória. Mal sabiam eles que a “noite de núpcias” nos SMAS ia ser num motel rasca à beira da estrada… Até já há nos serviços municipais quem coloque a hipótese deste acordo servir apenas para que alguns comunistas não tenham de regressar às suas ocupações profissionais anteriores à política, o que os obrigaria a atravessar o Tejo todos os dias.

A lua-de-mel não durou, por isso, até ao Natal. Em público, PS e CDU trocavam presentes e elogios hipócritas, com discursos dignos de postal de Natal: “união”, “boa-fé” e “compromisso com os almadenses” foram as prendas embrulhadas no sapatinho da coligação. Tremendos votos de confiança mútua, não haja dúvida. Dizem socialistas e comunistas que a parceria “assenta na boa-fé” – acredita sem se rir? Boa-fé, essa mesmo que dura até à primeira traição. E não demorou nada: bastaram dois ou três dias para surgirem problemas no paraíso.

O primeiro grande arrufo conjugal veio com a tal presidência dos SMAS. O acordo de governo dizia que a CDU ficaria na presidência e que a administração teria um vogal indicado pelo PS e outro independente de escolha conjunta. Parecia tudo claro, certo? Mas a nossa baronesa Inês de Medeiros tinha outros planos, como se esta história fosse um argumento rasca daqueles que só ela sabe interpretar.

À socapa, indicou-se a si própria como vogal número um dos SMAS em representação do PS, colocando-se literalmente como vice-presidente do serviço – uma espécie de sogra intrometida que se muda para casa do jovem casal sem aviso. A ex-líder da oposição Amélia Pardal quase teve uma apoplexia quando soube desta queda em desgraça da sua querida CDU. José Lourenço terá exclamado algo como “Que é isto, camaradas?!” – mas em surdina, que a disciplina partidária comunista não permite cenas de ciúme em público e também ele agora é forçado a ser ajudante da baronesa. O certo é que a CDU engoliu em seco esta inserção súbita da baronesa como número dois dos SMAS. A tal boa-fé, hein? Foi como descobrir, na lua-de-mel, que afinal a sogra vai dormir no quarto ao lado.

Mas a novela não ficou por aqui: o terceiro elemento da administração dos SMAS, que devia ser “nomeado por mútuo acordo”, acabou escolhido unilateralmente pelo PS. Sem consulta prévia, a baronesa Inês arranjou um “boy” do PS de Sesimbra para ocupar o cargo de vogal. Apresentou-o com a cara de pau de quem leva um penetra para o jantar de família dizendo que “ele tem experiência em água e saneamento”. Ah, bom, se é de Sesimbra e sabe abrir a torneira, então está qualificado para gerir a água de Almada!

Diz ela que o CV técnico do senhor Nélson Pólvora – ex-vereador pelo PS lá em Sesimbra – justificou a escolha. Pois, claro… Nada a ver com ser camarada de partido ou amigalhaço. Imagine o episódio: Inês de Medeiros com aquele sorriso glacial de baronesa iluminada, a introduzir este seu afilhado à família CDU, enquanto Pardal e Lourenço se entreolham, atónitos, sem saber se hão de rir ou chorar. A tal “boa-fé” de que falavam no acordo foi pela pia abaixo junto com a água dos SMAS.

Por esta altura, a coligação PS-CDU já parecia um casamento às turras, daqueles em que se tranca o cão para os vizinhos não ouvirem a gritaria. Em público ainda tentavam salvar a face: fotos juntos nas iluminações de Natal, sorrisos congelados nos concertos da época, discursos coordenados a dizer que “importa garantir estabilidade” e que o amor – perdão, a união – é pelo bem dos almadenses. Tudo treta, claro. Nos bastidores, a desconfiança grassa.

A CDU, paranoica como cônjuge traído, exigiu logo de entrada uma auditoria externa e independente a tudo que mexe na Câmara, nos SMAS e na WeMob. Ora digam lá se isto não é amor genuíno: sobe ao altar mas já a exigir teste de paternidade! Os comunistas mal colocaram a aliança no dedo e já estavam a pedir a auditoria às contas conjuntas, tipo cônjuge ciumento a pedir ao outro os extratos bancários do mês. É caso para dizer: confiança zero. Se houvesse detector de mentiras no gabinete presidencial, a fila dava a volta ao Cristo-Rei.

Enquanto isso, a baronesa Dona Inês continua a reinar com tiques autoritários. O PS local sempre teve aquele arzinho nobiliárquico com Medeiros no comando, e agora, com a CDU a tiracolo, a Presidente faz de conta que cede poder mas mete o bedelho em todo lado. Ausência de orçamento para 2026? Pois claro, até agora nada de orçamento aprovado e o ano a acabar. Em vez de planificarem as finanças do município, o casal maravilha passou semanas a sacudir a água do capote: que se atrasou por isto, que a culpa é da transição, que o Pai Natal roubou o esboço do orçamento… Desculpas não faltam, mas dinheiro e plano para 2026 é que nem vê-lo. Prometeram mundos e fundos no acordo, mas na prática estão a empurrar com a barriga. Almada aproxima-se do Ano Novo sem orçamento, mas com um belo cabaz de justificações esfarrapadas. “Estamos a trabalhar no documento”, dizem eles – sim, tanto quanto um casal em crise “está a trabalhar na relação” enquanto dorme em camas separadas.

Este casamento político por conveniência foi o gran finale de um ano já de si tresloucado. Recapitulemos com humor o enredo de 2025 em Almada.

Início de 2025: A CDU afiava a espada para derrubar a “dinastia”. Luís Palma e camaradas gritavam em comícios que os últimos 8 anos foram de abandono, lixo e destruição da obra feita. Almada merecia melhor! A baronesa e o seu séquito ripostavam que só eles garantiam estabilidade e progresso (apesar de pouco haver para mostrar além de powerpoints mal amanhados). As obras emblemáticas continuavam eternamente adiadas: o Cais do Ginjal, prometido e falhado vezes sem conta; o famoso Innovation District, vendido como o Silicon Valley do Tejo mas ainda um descampado; e outras quimeras de betão que nunca saíram do papel. PCP e PS culparam-se mutuamente por esses projetos-fantasma, num bate-boca digno de novela das nove. Agora ambos gritam baixinho.

Campanha eleitoral: Beijos e abraços? Não, aqui foi murro e pontapé (metaforicamente, claro). A CDU jurava que jamais se vergaria ao PS, que Inês de Medeiros era uma usurpadora “vinda de Lisboa” sem amor por Almada, que a cidade precisava de se livrar da porcaria – quer do lixo nas ruas quer da sujidade moral socialista. Amélia Pardal era incansável nas críticas, José Lourenço polvilhava discursos de indignação e citava o INE. Inês de Medeiros, por seu lado, fazia-se de vítima e pintava a CDU como retrógrada e obstinada. Até o Pai Natal duvidaria que estes dois partidos alguma vez pudessem sentar-se à mesma mesa.

12 de outubro de 2025: Sai a sorte grande eleitoral… ou talvez um bilhete premiado ao contrário. O PS vence por um triz, apenas 29% dos votos e 4 vereadores, longe da maioria; a CDU vem atrás com 20,6% e 3 vereadores eleitos. PSD e Chega metem 2 cada, embaralhando ainda mais as contas. O resultado seria ingovernabilidade à vista. Almada olha para os seus pretendentes políticos e percebe que nenhum consegue dançar sozinho. É aquele momento num baile em que os parceiros que passaram a noite a trocar pisadelas se veem obrigados a dançar juntinhos na última música.

17 de novembro de 2025: Plot twist! PS e CDU anunciam acordo de governação conjunto. Oito anos de guerra atirados pela janela, entra o amor súbito. A explicação oficial? “Importa garantir estabilidade” e evitar que a malvada “direita” meta a colher. A explicação real? Tachos, meus caros. A CDU não resistiu aos cargos e pelouros oferecidos – dois vereadores a tempo inteiro, um a meio tempo, e as tais pastinhas para os camaradas. Com sorte também terão direito a um cantil dos SMAS como oferta. Quem desdenha quer governar, pelos vistos. Luís Palma, outrora crítico feroz, aparece agora ao lado da baronesa como vice-presidente de facto do município, acumulando o cargo de presidente dos SMAS e pelouros sociais. Amélia Pardal, que concorreu à Assembleia Municipal vociferando contra o PS, engoliu um sapo e vendeu a alma. José Lourenço, que entre referências ao INE até então clamava coerência, viu-se na posição de ajudante, obrigado a fazer a quadratura do círculo: criticar o PS de dia e co-gerir com o PS à noite, tudo isto enquanto cita o INE. Se isto não é esquizofrenia política, o que será? A CDU de Almada enlouqueceu mesmo.

Dezembro de 2025: A realidade bateu forte e feio. A “lua-de-mel” durou menos que um piscar das luzes natalícias. Os arrufos sucedem-se: o caso SMAS (a intriga da vogal infiltrada e do boy de Sesimbra) implodiu a confiança; as reuniões de câmara ficaram tensas; e já corre pelos corredores que há “mal-estar” entre os recém-casados.

Enquanto isso, a higiene urbana – agora responsabilidade da CDU – continua a ser um quebra-cabeças: pelo menos agora, quando alguém se queixa do lixo acumulado, os comunistas não podem apontar o dedo ao PS… têm de pegar na vassoura e varrer. Os mesmos que bradavam contra a sujidade agora dão desculpas sobre “processos em curso” e “herança difícil”. Nada como provar do próprio veneno, não é?

E o prometido espírito natalício de paz e união? Está mais para divórcio litigioso. Nos discursos de final de ano, Inês de Medeiros e a CDU ainda tentarão fingir que tudo vai bem, qual casal em crise a posar para a foto de família. Mas os almadenses não são tolos: já toparam as olheiras e os sorrisos amarelos.

Resta saber quanto tempo dura este casamento ridículo. A história de Almada em 2025 termina com um enorme ponto de interrogação sobre 2026. A coligação PS-CDU entra no novo ano como um recém-casal à beira de um ataque de nervos: sem orçamento aprovado, com auditorias a revirar gavetas (à procura de esqueletos, talvez), obras estruturais por fazer e a confiança mútua em farrapos. Inês de Medeiros continuará a sua saga como baronesa mandona, e a CDU continuará refém do pacto que fez – a ranger os dentes em privado enquanto em público assegura que “o amor é lindo e vai superar tudo”, como a Cristina Ferreira.

Mas amor sem confiança é como Almada sem ponte: um dia tudo cai. Quem diria que veríamos comunistas e socialistas num matrimónio de fachada, só para manterem o poder, evitar o trânsito matinal na ponte 25 de Abril e nomear uns amigos? A CDU de Almada enlouqueceu, sem dúvida.

E Almada, paciente, assiste a esta tragicomédia autárquica, de pipocas na mão, aguardando o próximo capítulo: será reconciliação sincera ou divórcio litigioso? Façam as vossas apostas. Uma coisa é certa – este romance político está mais para tragédia do que para conto de fadas, e 2026 promete capítulos ainda mais rocambolescos. Preparem-se, que isto vai continuar… e nós cá estaremos para aplaudir o fim desta loucura quando tudo rebentar. Assim espero.

David Cristóvão

Ex-autarca

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