Relação condena piloto por mortes na praia de S. João
Decisão do Tribunal de Almada revertida
Em Maio deste ano, o Tribunal de Almada tinha absolvido o arguido por entender que “cumpriu todos os procedimentos de emergência”, concluindo pela “ausência de negligência grave”. O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) vem agora reverter a decisão da primeira instância. e condena a uma pena suspensa de quatro anos de prisão, o piloto que em 2017 aterrou de emergência na praia de S. João, na Costa da Caparica, matando um homem e uma menina.
O acórdão, a que a agência Lusa teve acesso, refere que o TRL “revogou a decisão absolutória da primeira instância e condenou o arguido, Carlos Conde d’Almeida, pelos crimes de homicídio por negligência e condução perigosa de meio de transporte aéreo”, na sequência dos recursos interpostos pelo Ministério Público (MP) e pelos familiares das vítimas.
“A condenação ocorreu devido ao entendimento de que o arguido agiu com negligência grave ao não seguir as normas técnicas de segurança, optando por tentar religar o motor [após falha] em vez de escolher imediatamente um local seguro para aterragem, resultando em colisão fatal”, sustentam os juízes desembargadores no acórdão, com data de Quarta-Feira, 6 de Novembro.
O TRL decidiu suspender a pena de prisão por igual período (quatro anos), medida “condicionada à frequência, durante o período de suspensão, de um programa de formação em segurança aeronáutica, a ser promovido por entidade competente”.
“A escolha da pena de prisão é justificada pela gravidade das consequências do comportamento negligente do arguido, que resultou na morte de duas pessoas. A aplicação de uma pena de prisão responde tanto à necessidade de reprovação da conduta quanto às exigências de prevenção geral, dado o efeito letal e evitável da ação”, justifica o TRL
A aterragem de emergência do avião ligeiro de instrução Cessna 152 que levava a bordo o piloto instrutor e um aluno, no dia 2 de Agosto de 2017, provocou a morte de uma menina de 8 anos e de um homem de 56, que se encontravam na praia de São João da Caparica.
Em 14 de Maio deste ano, o Tribunal de Almada absolveu o arguido por entender que cumpriu todos os procedimentos de emergência, concluindo pela “ausência de negligência grave”.
O tribunal de primeira instância considerou ainda que as tentativas de reactivação do motor, ainda que prolongadas, seriam justificáveis pela natureza imprevisível da emergência e pela complexidade da situação em voo.
O TRL teve um entendimento diferente e considera que a tentativa prolongada de reactivação do motor desviou o foco das obrigações de segurança que o piloto deveria ter tido, “violando o dever de cuidado exigido” nas normas de aviação.
“O TRL entendeu que o arguido, com a sua experiência, deveria ter priorizado a escolha de um local de aterragem seguro ao invés de insistir em religar o motor em baixa altitude, o que configurou um comportamento imprudente e negligente em situação de risco elevado”, lê-se no acórdão.
A Relação de Lisboa salienta que a pena visa “reforçar a sua consciência sobre a gravidade dos efeitos de uma conduta negligente, e fomentar uma práctica profissional mais segura e rigorosa”.
“A culpa do arguido é significativa, dado que, como piloto instrutor, ele tinha pleno conhecimento das normas de cuidado que exigem a escolha imediata de local seguro para aterragem em caso de falha do motor. Ao insistir na tentativa de reactivação do motor, o arguido criou um perigo objectivo e evitável para a vida de terceiros”, sustenta o TRL.
No âmbito da prevenção geral, este tribunal superior assume que “a sociedade exige uma resposta penal que desestimule a desconsideração das normas de cuidado em contextos de risco, como a aviação”.
Os juízes desembargadores avisam também que a pena “deve servir de exemplo para profissionais da aviação, enfatizando a seriedade das normas de segurança e a obrigatoriedade da sua observância”.
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