O Partido Socialista ganhou (perdendo) em Almada

Há vitórias que pesam como derrotas. A noite eleitoral das Autárquicas de 12 de outubro de 2025 em Almada foi disso exemplo: o Partido Socialista manteve a liderança do concelho, mas viu a sua base de apoio popular diminuir de forma significativa. 

Partilhe:

Os números não enganam e a matemática é implacável: menos um vereador, menos três deputados municipais, menos uma junta de freguesia, apesar de ter ganho outra. A perda de mandatos na Câmara e na Assembleia Municipal traduz-se numa menor capacidade de governar com estabilidade e de impor agenda política sem negociações constantes. Foram menos 10% de votos em relação às últimas autárquicas. O PS continua a ser a força dominante em Almada, mas já se encontra em declínio.

É paradoxal: o mandato 2021/2025 foi muito produtivo em termos de obra municipal, com investimentos visíveis em infraestruturas e equipamentos em todo o território. 

A derrota na Freguesia da Costa de Caparica é mais do que aritmética eleitoral, é simbólica. Trata-se de uma freguesia estratégica, com forte peso social e económico, que escapa agora ao controlo socialista.  É curioso que tenha sido precisamente aí, onde a Câmara apresentou trabalho visível — a Estrada Florestal, o Parque Atlântico, a Rotunda na entrada da cidade, a substituição da conduta principal de abastecimento de água potável, o Agroparque, etc — que o eleitorado decidiu virar costas.  Isto sugere que a política local não se mede apenas pela obra feita, mas também pela perceção de proximidade, identidade e representação.

A vitória no Laranjeiro e Feijó compensa parcialmente, mas não neutraliza a perda da Costa de Caparica. Nas restantes freguesias, o PS manteve o controlo, mas com margens mais curtas, sinal claro de que o eleitorado está a testar alternativas. A erosão é lenta, mas consistente.

A pergunta é inevitável: como explicar a perda de 10% dos votos após um mandato produtivo? A ciência política oferece algumas pistas: Desconexão geracional: os jovens urbanos, mais exigentes e menos fiéis a partidos tradicionais, não se revêem no discurso socialista. Falha na territorialização da política: a derrota na Costa de Caparica mostra que a obra não substitui a proximidade. A política local exige presença, escuta e envolvimento comunitário. Excesso de confiança: a perceção de Almada como bastião seguro levou a uma campanha menos mobilizadora, sem inovação discursiva. Problemas organizativos: a direção concelhia e a coordenação autárquica revelaram ineficiência, incapazes de transformar obra em narrativa política convincente.

A quebra de 10% não é apenas estatística, é um sinal de descontentamento profundo. Em ciência política, erosões eleitorais desta magnitude são frequentemente prelúdios de ciclos de alternância. O PS venceu, mas fragilizado. A vitória é frágil, marcada por perdas que não podem ser ignoradas.

A direção concelhia do PS não pode, nem deve esconder-se atrás da bandeira da vitória. É preciso reformular estratégia, modernizar o discurso e reconquistar a confiança dos munícipes. O eleitorado está mais volátil, menos fiel, mais exigente. Se não houver mudança de rumo, esta vitória poderá ser apenas o prelúdio de uma derrota maior nas próximas eleições.

Pedro Dias Pereira

Advogado e ex-deputado Municipal eleito pelo PS na Assembleia Municipal de Almada.

, , , ,