Transtejo alvo de buscas pela PJ no dia do seu 50º aniversário
Em causa estão suspeitas de fraude na obtenção de fundos comunitários, corrupção activa e passiva/prevaricação na renovação da sua frota
A Polícia Judiciária (PJ) realiza, esta Quarta-feira, 17 de Dezembro, buscas na sede da Transtejo, em Lisboa. A operação “Navis” levada a cabo através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC), na sequência de um inquérito dirigido pela Procuradoria Europeia (PE), centra-se em “crimes de fraude na obtenção de subsídios, corrupção activa e passiva e/ou prevaricação na renovação da frota da empresa”, confirma a PJ em comunicado.
Este inquérito advém de uma denúncia feita ao PE pela Associação Frente Cívica (FC), que se dedica à defesa de causas de interesse público.
“No inquérito em apreço, a TTSL – Transtejo Soflusa, S.A. beneficiou da comparticipação de fundos comunitários, em cerca de 17 milhões de euros, no âmbito do POSEUR – Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso dos Recursos do Portugal 2020.”, pode ainda ler-se no comunicado da PJ.
Em Fevereiro de 2020, foi lançado um concurso público internacional para o fornecimento de 10 navios eléctricos e um conjunto de baterias, com o valor base de 57 milhões de euros, optando por adquirir-se, posteriormente, os restantes nove conjuntos de baterias em procedimento autónomo”, pode ler-se no mesmo comunicado.
Durante a investigação, a PJ recolheu indícios de que esse concurso tinha como objectivo beneficiar o Grupo ETE, também alvo desta operação.
No final de 2020, a Transtejo comprou dez novos barcos eléctricos para realizar as ligações fluviais entre Lisboa e Cacilhas, Montijo e Seixal. No entanto, nove dos navios foram comprados sem baterias.
O Tribunal de Contas (TdC) acabou por chumbar o ajuste directo para a compra das baterias e considerou que comprar barcos eléctricos sem baterias “é o mesmo que comprar um carro sem motor.” O negócio foi considerado ilegal e o relatório do Tribunal de Contas foi enviado para o Ministério Público (MP) para eventual apuramento da responsabilidade financeira e/ou criminal.
“Na sequência da recusa de visto do Tribunal de Contas ao contrato para compra das baterias, concluído após procedimento de ajuste directo por violação dos princípios da concorrência e da igualdade de tratamento, o concurso público internacional para a compra das baterias dos navios lançado em Junho de 2023 pela Transtejo veio a ser ganho por uma entidade terceira, que indicia ter tido vantagem competitiva sobre qualquer outro concorrente”, acrescenta a PJ.
O concurso de compra de 10 navios foi ganho pela construtora naval espanhola Astilleros Gondan, que seria também quem tinha ganho o concurso inicial das baterias, chumbado pelo TdC. No final, o TdC deu aval positivo ao segundo concurso de compra das baterias, igualmente adjudicado à mesma empresa, por um valor mais elevado (mais meio milhão de euros) que o do concurso inicial que o TdC considerou ilegal.. É também esta empresa espanhola quem está encarregue pela manutenção da frota eléctrica da Transtejo.
Na sequência do chumbo do TdC, e do seu relatório demolidor, o Conselho de Administração da Transtejo à época acabou por demitir-se.
Em paralelo, as autoridades procederam também ao cumprimento de cinco mandados de busca não domiciliária, no âmbito de inquérito dirigido pelo DIAP Regional de Lisboa, “em que se investigam crimes de participação económica em negócio”.
Neste caso, relata ainda a PJ na mesma nota, “denúncias sustentam uma sistemática violação das regras da contratação pública pelo Conselho de Administração da Transtejo, no âmbito da gestão da manutenção de navios, essencialmente, diversas adjudicações por ajustes directos a empresas pertencentes ao Grupo ETE”, em serviços na manutenção dos navios.
A Transtejo confirmou as buscas nas suas instalações e esclareceu que os factos em causa “reportam-se a um período anterior a Outubro de 2025, mês em que tomou posse o actual Conselho de Administração”. Assegura que “está a colaborar com as autoridades competentes, prestando toda a informação e apoio solicitados”.
Na mesma nota, a empresa, que celebra hoje 50 anos de existência, o novo Conselho de Administração reitera “o seu compromisso com os princípios da transparência, integridade e da legalidade na prossecução do interesse público” e sublinham o foco “na continuidade da sua actividade e na prestação de um serviço público de qualidade”.
Empenhados na operação policial “Navis” estiveram 20 elementos da Unidade de Combate à Corrupção da PJ, quatro especialistas de perícia científica da Unidade de Perícia Tecnológica e Informática, um especialista da Procuradoria-Geral da República e um magistrado do Ministério Público.
A investigação prossegue para esclarecer responsabilidades e determinar se houve benefício indevido de empresas específicas, avaliar a extensão das supostas irregularidades na gestão da empresa pública de transporte fluvial.
Transtejo celebra meio século de existência
Actualmente, a transportadora fluvial opera em cinco ligações fluviais dispondo de 28 navios, dos quais 10 são 100% elétricos. Em 2024, a empresa transportou mais de 21 milhões de passageiros e, até Novembro de 2025, já tinha ultrapado os 19 milhões.
“O atual desafio é estabilizar a oferta elétrica”, indicou Rui Ribeiro Rei, presidente do Conselho de Administração da empresa de transporte fluvial. “O mês de Novembro de 2025 representou uma redução em 92% das supressões de navios, o que quer dizer que estamos no caminho da normalização da oferta, do crescimento e da introdução na operação da frota eléctrica”, adiantou o administrador do grupo que une a Transtejo, fundada em 1975, à Soflusa, criada em 1993.
A empresa, que assinala hoje meio século de existência, encontra-se actualmente a analisar “novas ofertas e novas localizações”. Algés e Parque das Nações podem vor a ser hipóteses”, antecipou Rui Ribeiro Rei, apontando que “os estudos no próximo ano vão trazer resultados para estas necessidades”.
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