Barcos eléctricos da Transtejo estão mesmo a ser carregados a gasóleo
Plano de Renovação da frota marcado por polémicas, atrasos, e derrapagem financeira
A polémica surgiu quando o PCP tornou público nas suas redes sociais e site, que a nova frota eléctrica da Transtejo estaria a ser carregada com recurso a geradores alugados alimentados a gasóleo, na doca 13 da Margueira. Numa pergunta dirigida à ministra do Ambiente e da Energia, Maria da Graça Carvalho, através da Assembleia da República, os deputados do PCP Paula Santos e Alfredo Maia perguntaram “que contrato [de aluguer] foi realizado, por quanto tempo e qual o gasto mensal”, entre outras perguntas.
A Transtejo confirmou à SIC Notícias o insólito da situação, a 17 de Julho, alegando que “para que todos os navios possam estar ligados à corrente, de modo a cumprir as recomendações dos fabricantes, foi forçada a alugar os geradores em questão, apenas pelo período necessário à conclusão da empreitada do segundo posto de transformação, que deverá estar concluído em Setembro”. O Polígrafo fez também um fact-cheking que confirma a utilização dos geradores a gasóleo.
Até essa data, os cinco navios eléctricos que já foram entregues ”vão continuar a ser carregados com recurso a geradores a gasóleo”. A transportadora fluvial elucidou que os “10 novos navios têm um Sistema Eléctrico de Propulsão, composto por vários módulos de baterias de iões de lítio, baseado em acumuladores e motores eléctricos”. E que, quando “devidamente equipados com baterias”, estas embarcações “carregam de dois modos”.
Quando estão “ao serviço”, os navios eléctricos “carregam as suas baterias entre viagens” – o chamado “carregamento rápido” – por via de “torres Zinus instaladas nos pontões dos terminais fluviais do Seixal (1), do Cais do Sodré (2), de Cacilhas (1) e do Montijo (1), as quais são alimentadas por estações de carregamento de energia em terra, construídas para o efeito”.
Existe ainda, a modalidade de “carregamento lento” – para quando as embarcações estão “fora da escala de serviço” e “atracados na Doca 13, sita em Cacilhas”. Nessas situações, “permanecem permanentemente ligados à corrente eléctrica, a fim de manter as baterias carregadas e balanceadas”.
É para dar resposta a esta necessidade que estão a ser utilizados os geradores a gasóleo. A Transtejo explicou que a “chegada a Lisboa do quinto navio eléctrico”, já “dotado de baterias como todas as outras unidades, veio reforçar a necessidade de dispor de uma segunda fonte de energia, garantindo que todos os navios já recepcionados pela TTSL se mantenham ligados à corrente eléctrica”.
A mesma fonte acrescentou que “a fim de cumprir as recomendações dos fabricantes (ABB e Corvus), a TTSL foi forçada a alugar os geradores em questão, assegurando assim as condições necessárias de carregamento e para evitar quaisquer danos nos equipamentos, nomeadamente, nas baterias.”
A Transtejo assegurou que essa “fonte de alimentação alternativa é utilizada apenas pelo período necessário à conclusão da empreitada do segundo posto de transformação” a qual estimam estar pronta durante o mês de Setembro. A transportadora garantiu, no entanto, “que os dois geradores são insonorizados e com baixas emissões poluentes”, funcionando “entre as 8 e as 17 horas”.
Os geradores foram “alugados ao Grupo Vendap S.A., durante um mês, pelo preço de 10.000 Euros + IVA”, com o fornecimento a ter tido início “no passado dia 24 de Junho, devendo ser renovado por mais um mês, até conclusão da empreitada referida”. A data seria então finais de Julho, mas a situação mantém-se.
Das cinco estações de carregamento “de terra que asseguram a alimentação das torres Zinus, encontra-se concluída e em fase de testes a estação do terminal fluvial do Seixal”. As previsões da empresa apontam para que “a estação de carregamento do terminal fluvial do Montijo fique concluída durante o mês de Agosto, e que a estação de carregamento do terminal fluvial do Cais do Sodré fique concluída em Dezembro”, ao passo que a “construção da estação de carregamento de Cacilhas está programada para 2025”.
Contradições, atrasos, polémicas e uma derrapagem de 39,2 milhões de euros
O planeamento actual contradiz o que tinha sido afirmado pelo ex-ministro do Ambiente e da Acção Climática, Duarte Cordeiro, ainda durante o governo de António Costa, que também tutelava os transportes urbanos. A 25 de Outubro de 2023, numa audição parlamentar na comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação, requerida pelo PCP, PSD, PS, BE e IL sobre a aquisição de navios eléctricos e de baterias pela Transtejo, afirmou que “ainda em 2023 entrará em serviço o primeiro navio eléctrico movido a baterias no rio Tejo, entregue em Março de 2023 e que já terminou a fase de testes”, antecipando assim a operação.
O então ministro disse também que existia “a possibilidade de ter quatro navios a operar no rio Tejo no final do primeiro trimestre de 2024, com a operação a iniciar-se no Seixal.” Duarte Cordeiro disse ainda que “as obras de instalação dos postos de carregamento dos navios, deverão estar concluídas em Dezembro no Seixal, seguindo-se as do Montijo em Fevereiro de 2024, as do Cais do Sodré em Maio e, as de Cacilhas em Junho.”
A presença do ministro na comissão parlamentar concluiu o processo de audições que levou ao Parlamento a anterior e a actual presidente do conselho de administração da Transtejo, Marina Ferreira e Alexandra Ferreira de Carvalho respectivamente, assim como o ex-ministro do Ambiente, Matos Fernandes.
Agora, a Transtejo afirma que “nenhum dos 10 navios eléctricos está ao serviço e a transportar passageiros”, com a operadora a estar, actualmente, “a fazer testes para que os navios possam operar, a partir de Setembro, com total segurança”. Segundo as previsões da empresa, os “novos navios eléctricos deverão entrar ao serviço público na ligação fluvial Seixal – Cais do Sodré na segunda quinzena de Setembro”. A previsão anterior apontava para o início das viagens no final de Junho ou início de Julho.
Até ao final do ano, está prevista a entrega de mais dois navios eléctricos, os restantes três deverão ser entregues em 2025. Até ao momento foram recepcionados cinco navios eléctricos, que se encontram a ser carregados através de geradores a gasóleo, sem que nenhum esteja a reforçar a frota envelhecida ou a melhorar o serviço de transporte fluvial prestado pela Transtejo.
Este foi desde o início um processo marcado pelas dúvidas sobre a fonte energética. Em 2018, a Transtejo apresentou uma proposta para comprar uma frota híbrida a diesel e eléctrica, que foi recusada pelo Governo. No ano seguinte, o Executivo recusou a proposta para uma frota exclusivamente eléctrica e lançou o concurso para navios a GNL, que acabou deserto. No início de 2020, optou finalmente por embarcações a baterias.
A polémica pública em torno do acordão do Tribunal de Contas, que foi demolidor sobre o processo de compra dos novos navios eléctricos e das suas baterias, culminou na demissão do anterior Conselho de Administração da transportadora fluvial. O primeiro navio eléctrico recepcionado, único com bateria incluída, chegou danificado a Lisboa. Com o novo contrato para baterias, pontos de carga a renovação da frota da Transtejo ascende a 96,7 milhões de euros, uma derrapagem de 39,2 milhões de euros, em relação aos 57,5 milhões previstos em investimento em 2019. A este valor acresce ainda o do aluguer dos geradores a gasóleo.
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